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Celi Audi

celi_audiHistória temática

Identificação
 

Meu nome é Celi Audi, nasci em São Paulo, no dia 22 de outubro de 1959.

 

 

Formação Acadêmica

 

 

Sou bacharel em Ciência da Computação.

 

 

Trajetória Profissional

 

 

Fui estagiária no IPT [Instituto de Pesquisas Tecnológicas] durante quatro anos e depois, estagiária no DIEESE mais um ano antes de ser contratada. Fora isso, fiz outros tipos de trabalho: dei aula de inglês em supletivo, dei bastante aula particular de português e matemática. Mas meu primeiro emprego formal, com carteira assinada, foi no DIEESE.

 

 

Trajetória no Dieese

 

 

Eu conhecia bem pouco o DIEESE, não sabia como era. Outro dia, eu estava entrevistando uns meninos para contratar e vários deles nunca ouviram falar do DIEESE, ou tinham uma noção muito precária do que é. Quem ouviu falar do DIEESE, relaciona às estatísticas e acha que é do governo. Depois eu fui fazer a conta e falei: “Com essa idade, eu também não conhecia direito”, apesar de eu ter alguma militância no movimento estudantil. Entrei na USP [Universidade de São Paulo] em 77. Era um período em que tinha passeata, movimento, e mesmo assim o DIEESE não estava presente na minha vida. Conhecia um pouco, por causa daquela história do Delfim [Antônio Delfim Netto – ex-ministro da Fazenda no Governo Militar]com o expurgo do índice, mas não conhecia o trabalho.

Eu estava procurando trabalho. Fiquei bastante tempo no IPT, mas já tinha dado o tempo do estágio, estava a ponto de me formar e lá não havia perspectiva de contratação. Tinha amigos que trabalhavam no DIEESE e um deles teve um problema de saúde, ia se afastar por um tempo e me ofereceu. Fui parar no DIEESE pelas mãos do Maurinho [Mauro Kohan]. Cheguei lá na Rua das Carmelitas, o DIEESE era dentro do prédio do Sindicato dos Marceneiros, no centro de São Paulo, um lugar que não tinha janela. Era assim como se fosse um pedaço de um corredor separado por divisórias até o teto. Era um lugar meio sufocante e uma daquelas divisões era a salinha de informática, tinha uns dois equipamentos, bem antiguinhos, micros de 8 bits, um deles ainda com uns disquetões de 8 polegadas. Uma coisa enorme, o computador era um gabinete, devia ter quase um metro cúbico, fazia quase nada e era isso que a gente tinha. Eu fui lá e falei com o Luiz Eduardo Hirano, que era o chefe desse setor e explicou o que tinha a fazer. Logo no comecinho, quando entrei no DIEESE, o Suplicy [Eduardo Suplicy] foi lá numa reunião política, não me lembro o que era, só sei que foi emocionante ver uns caras de que a gente só ouvia falar. Era uma época da Pesquisa de Padrão de Vida e Emprego, a PPVE, que teve seus dados levantados em 82, 83, e eu entrei no DIEESE em 84, quando estava se fazendo a consistência da informação, ou seja, o desenvolvimento de programas de consistência. Estávamos muito no início, a capacidade de processamento era muito pequena. Muitas coisas não eram feitas lá. Na época era comum alugar horas num bureau de computação, um serviço que tinha computadores de grande porte. Íamos lá com os cartõezinhos perfurados que eram lidos e passados para uma fita.

Em 87, eu estava no Sindicato dos Bancários e fiquei até os anos 90, praticamente voltada mais para a área de administração sindical. Minha filha nasceu no comecinho de 91, e meu retorno ao DIEESE já foi aqui para o Parque [Parque da Água Branca]. O Luiz [Luiz Hirano] tinha saído e o Jorge Uehara, assumido a supervisão do meu setor. Em 93, 94, começamos a desenvolver outra pesquisa de orçamentos familiares, porque de tempos em tempos tem que refazer a pesquisa para calcular o peso que certos produtos têm no orçamento familiar. O Jorge Uehara foi o coordenador dessa pesquisa e eu também trabalhei nos dados. Em 96, ainda estava acabando de fazer essa pesquisa e o Jorge saiu da supervisão. Como eu era a funcionária mais antiga e com mais experiência nessa época, assumi a supervisão.

 

Cotidiano no Trabalho
 

Fazíamos, por exemplo, cálculos da distribuição salarial baseada em dados da guia de contribuição sindical, aquele imposto sindical que todo mundo paga. As entidades tinham as listagens dos contribuintes com os dados individuais, como a porcentagem do salário, o cargo ou função da pessoa. Nós pegávamos essas listagens e fazíamos o cálculo da distribuição salarial, por exemplo, dos metalúrgicos do ABC, ou dos bancários de São Paulo, coisas assim. Só que a gente fazia lá no bureau. No DIEESE mesmo, estávamos começando a fazer esse processamento dos dados da pesquisa, da consistência. Era um ambiente pequeno em que nós estávamos praticamente todos juntos ali, dividindo as tarefas todas - aliás, isso não mudou muito, ainda é assim. Em um período, 84, 85, teve a visita de um americano, o Larry Wright, que era ligado a alguma entidade internacional, não sei qual. Ele veio aqui para fazer, acho que talvez, o que era o primeiro projeto internacional de informática. Ele veio com o micro dele a tiracolo - é o que deveria ser um notebook, mas não existia isso ainda. Era uma caixinha muito menor, "altamente tecnológica" - para desenvolver um cadastro de empresas multinacionais. Ele passou uns meses fazendo isso. Trabalhávamos dividindo o ambiente, mas eu fazia outra coisa, a programação da consistência dos dados da PPVE, e depois houve a fase de homogeneização desses dados.

 

 

Tecnologia

 

 

Em 87, eu já estava trabalhando num projeto de informatização sindical, fomos pioneiros nisso. A idéia era ajudar a organizar as entidades e começamos do controle administrativo, que era uma zona, ninguém [as entidades] tinha controle ou tinha muito pouco. Você pegava sindicatos grandes e eles não sabiam quantos filiados tinham, não controlavam a arrecadação. Primeiramente, o DIEESE entrou com equipe de análise de organização e métodos para fazer levantamento de necessidades de informatização, plano diretor de informática. Fez isso em várias entidades, e quem ajudou a financiar foi o Sindicato dos Bancários de São Paulo. Em 87, estávamos alocados lá no sindicato, tinha o Luís Paulo [Luís Paulo Bresciani] que era analista de O&M [Organização e Métodos], eu, o Maurinho [Mauro Kohan], e mais algumas pessoas para começar a fazer o desenvolvimento de sistemas sindicais. Saímos dos 8 bits para os 16 bits, as máquinas eram XT , e o sistema operacional ainda não era esse DOS, era uma outra coisa, tudo bem antiguinho, era aquela tela escrita em verde. Só para ter uma idéia, vamos dizer que [a capacidade de processamento] era mais ou menos mil vezes menor que a de uma máquina dessas, dos usuários comuns de hoje [PC], sem considerar servidor. Em termos de processamento e armazenamento, tinha pouco espaço para guardar. Nos discos cabia muito pouco e tínhamos que colocar todas as coisas lá dentro. Isso era uma novidade, porque, em geral, o que se fazia era em grande porte, então tinha que alugar espaço, armazenamento, e aí, a gente estava inventando um jeito de fazer. Demorou um pouco para o negócio deslanchar, fora que a desorganização era grande também. Até você pegar, levantar todos os processos das entidades, fazer propostas de arrumação e implantar isso, seria impossível em menos de três ou quatro anos.

Mas aconteceu um desgaste natural desse projeto, porque a expectativa gerada no começo era que tivesse um resultado rápido e não foi rápido. Pelo menos para a expectativa, uns três ou quatro anos era muito tempo. O computador é uma coisa mitificada, acho que as pessoas imaginam que vai sair uma coisa mágica lá de dentro que não depende dos processos, como se fosse apenas fazer um programa e resolver, mas não é assim.

Acho que a presença na internet foi, certamente, um marco para nós. Fomos conseguindo desenvolver uma arquitetura que de certa forma está na ponta. São aspectos muitos técnicos, mas que para mim são muito importantes.

Começamos com correio eletrônico texto. Numa entidade com as dificuldades que a gente tem, isso é uma coisa que já mostra um caminho, que é o caminho da colaboração. Esse ambiente que a gente tem agora, que tem agenda corporativa, que tem fórum de discussão, mesmo que não esteja tudo em uso, é interessante, mas o fato é que batalhamos para implantar isso. E a adoção de software livre nos servidores, por quê? Não é só por uma questão econômica, o que a gente tem tentado falar é da filosofia que está por trás do software livre. Acho que é uma coisa que está de acordo com os princípios que orientam uma instituição como o DIEESE, em que a colaboração é exatamente o amparo para tudo isso.

Temos noção de como se faz o desenvolvimento na comunidade de software livre, então, isso é uma coisa que procuramos divulgar e explicar para as pessoas porque é importante manter isso - como é possível manter pessoas no mundo inteiro num projeto de colaboração, voluntário, em que você não ganha nada com isso e de que, ao mesmo tempo, tanta gente se beneficia. O que é muito comum na área de tecnologia é essa possibilidade de criar um método novo, uma coisa mirabolante. Cada dia que passa, aparece uma sigla nova, os caras inventam e começam a fazer um curso. Cada curso de oito horas é 3 mil reais por participante. Nunca vamos participar de nada disso, porque é um mundo completamente fora do nosso padrão. E, no entanto, são raras, de fato, as novidades. Mas acho que a gente consegue pegar o que tem de mais legal e falar: “Ah! Vocês têm o conhecimento? Então, vamos ver o que é isso aqui nessa instituição.” Pegamos um recortezinho desse conceito e começamos a fazer um trabalho em cima. Tudo demora muito tempo, mas se você olhar ao longo de dez anos, vê que tem consistência. Num momento, está com correio eletrônico; em outro, está com projeto de colaboração; em outro, está desenvolvendo um vocabulário, um Thesaurus para o DIEESE, que é uma forma de fazer registro de conhecimento; em outro momento, está registrando os perfis das pessoas. Então, estamos desenvolvendo vários aspectos e em alguma hora isso tem que virar um instrumento de gestão do conhecimento.

No entanto, se fosse realmente um projeto de gestão como se faz nas grandes empresas, para nós seria um investimento impossível. Sei lá, de 20 milhões de dólares. Então, o que eu destaco no trabalho do DIEESE é mais a maneira de fazer. É isso que eu acho que a gente faz bonito com o que a gente tem. É muito mais do que o resultado. Eu acho que se a gente for olhar o resultado, ele é muito aquém daquilo que a gente gostaria que fosse, mas eu acho que tudo que está por trás desse resultado é uma maneira de fazer que é construída. E é dentro do DIEESE que é possível fazer.

Teve um momento em que as pessoas começaram a ser usuários de computador no DIEESE, um momento de disseminação da microinformática. Qualquer cara que tinha um computador, que sabia operar uma planilha de cálculo, já se achava o rei da tecnologia. Já sentava, digitava seu texto, fazia seus cálculos. Acho que ficou um bom período assim no DIEESE. Era muito ruim, parecia que todo mundo entendia de tecnologia, qualquer um que fosse usuário. Tanto fazia a sua formação, então, quando você dizia “não vou fazer as coisas desse jeito, vou fazer de outro jeito”, tinha que ficar convencendo. E se você é mulher, aí que te escutavam menos ainda.

Sempre resistimos em termos soluções muito locais e muito específicas, sempre procuramos as soluções mais gerais, genéricas, o que, às vezes, demora mais tempo. Porque uma coisa é o cara resolver o problema ali na maquininha dele, usar o Access dele, fazer tudo para ele, mas é dele aquilo, ele não vai compartilhar com ninguém. Agora se você for colocar o banco de dados no servidor, um programa que seja de acesso para todo mundo, aí, o tamanho do problema é outro e muitas vezes a gente não conseguia mostrar isso. O cara não entendia porque demorava ou “porque não usa essa coisa da Microsoft?”. E a gente explicava: "Eu não uso porque vamos ficar presos nisso, vai ter que ficar comprando a versão mais nova." Ou seja, temos uma visão de longo prazo. Todas essas coisas que são mais estratégicas, eram mais difíceis de impor, ou de convencer. E aí teve um outro momento, a tecnologia anda depressa e as pessoas percebem que vão ficando naquele uso do que elas sabem e também não têm condição de ficar acompanhando. Acho que entre um momento e outro, fomos ganhando espaço, e daí sim, ficaram claros os limites de você ser um usuário. Começamos a ter mais possibilidade de mostrar um caminho. Mas até hoje é um pouco assim, quer dizer, estratégia é uma coisa difícil, ainda mais no DIEESE, que todo mundo acha que entende de tudo. É muito difícil você emplacar. Tem um aspecto bom, porque você é obrigado a fundamentar muito o que você faz, e às vezes em tecnologia tem muita coisa que você acha que vai funcionar, mas pode ser que não funcione. É arriscado, o tempo todo é desafio. E com um tantinho de grana, temos que fazer o melhor e usar uma coisa que não vá ficar perdida no tempo-espaço. E como a gente lida com isso? Acho que temos uma equipe muito boa, eu conto com pessoas que estão sempre discutindo as coisas comigo, temos parceiros terceiros também com quem vivemos discutindo coisas. E tem também a internet que é uma fonte de conhecimento, podemos pesquisar, podemos saber como estão as outras experiências. Conseguimos ter alguns indicadores de que certa coisa podem ter chance, pelo menos, de continuar e outras que tendem a desaparecer. Temos que ir jogando com todas essas variáveis.

Em 97, colocamos a primeira página do DIEESE no ar. A gente não tem investimento, não tem grana para bancar projetos de grande porte, mas eu acho que as idéias, as diretrizes que fomos implantando ao longo do tempo, sempre tiveram uma cara de ponta. Mesmo que a tecnologia em si não seja de ponta, os conceitos são da academia e a gente aproveita da melhor forma. Então, antes de ter navegador, página, web, antes de ter isso, fazíamos comunicação eletrônica via texto mesmo. Você tinha alguns grupos de discussão via texto que o DIEESE chegou a montar. Claro que a gente não conseguia envolver todo mundo falando, mas a gente sempre estava com uma pontinha lá. Colocávamos o modem de 2.400 para funcionar e tinha o sistema de distribuição de correio eletrônico interno. Fomos fazendo tudo ainda na fase de texto na internet. Isso foi no começo dos anos 90, 94, 95, 96. Acho que, em 95 já tinha internet grátis, mas para nós foi mais em 96.

Fomos seguindo, mais ou menos, um padrão de desenvolvimento normal, exceto por essas coisas que acho que antecipávamos. Houve uma fase que foi de grande desenvolvimento no Brasil que era usando os recursos do Windows, interface gráfica, mas não tinha nada a ver com internet. Nós pulamos, saímos direto daquela tela verde para o desenvolvimento web. Isso aconteceu, justamente porque quando a gente tinha dinheiro para investir de novo não tinha sentido fazer uma coisa que estava sendo feita nos últimos quatro anos, já havia coisa nova acontecendo e sempre tivemos essa idéia de expandir, de ter uma rede corporativa, remota, usando satélite da Embratel. Então, quando apareceu internet, para nós era uma alternativa barata, porque temos escritório regional em 15 lugares, temos não sei quantas subseções e temos entidades sócias espalhadas no Brasil. Para nós, foi essa facilidade de mudar totalmente da água para o vinho, porque naquele ambiente só Windows, não teríamos condição de fazer isso. Fomos investindo nessa área. Hoje todos os produtos que temos,ou quase todos, exceto os sistemas legados, que ainda são esses da tela verde, são desenvolvimentos web, então, podem ser usados, usufruídos por qualquer cara em qualquer ponto do planeta.

Hoje, temos uma pessoa com mais capacitação nessa área visual-gráfica, mesmo assim sua formação não é de programação visual, mas ela se interessou por essa área. Na época que criamos a página do DIEESE, só eu estava com as minhas noções estéticas e pouca capacidade de gerar uma coisa que fosse navegável e agradável. Fiz um projeto de conteúdo, na verdade foi o Prado [Antonio Prado], na época em que era o coordenador da produção técnica e era também um entusiasta dessas coisas. Acho que talvez, ele tenha sido um dos primeiros a falar nisso. Ele ia dando as diretrizes e a gente ia tentando realizar.

As primeiras páginas de internet no Brasil eram bem toscas do ponto de vista visual, até porque tinha pouco recurso de linguagem para fazer isso. Tinha lá um “htmlezinho” e para fazer a disposição dos elementos numa página era um absurdo, não tinha ferramentas, era tudo no código escrito. Eram códigos que você usava para dizer põe uma imagem aqui, põe um texto aqui, tinha que fazer tudo na marra, não tinha coisa de camada, não tinha nada que você pudesse usar muito de recurso. Tinha que ser na mão e era código. E, aí a gente também não tinha capacidade de criar imagem. Nós queríamos uma página que fosse, mais ou menos, na linguagem de cartum, que é uma linguagem que o DIEESE utiliza desde sempre. Nos cartazes de campanhas que estão pelos corredores dá para ver que sempre foram contratados cartunistas para expressar coisas que o DIEESE queria dizer. Então, a gente aproveitou quando o DIEESE estava fazendo 40 anos e o Paulo Caruso fez algumas coisas da campanha. Resolvemos aproveitar os desenhos ou elementos do desenho dele. Por exemplo, ele fez um cartum com um cara da construção civil penduradinho no andaime, pintando com a brocha, e saía aquele logotipo antigo do DIEESE. E ele estava com o chapeuzinho de jornal, em cima daquele andaime e tinha outros desenhos do Caruso que foram usados no folder. Havia outros tipos de trabalhador, com o chapeuzinho de metalúrgico, e outros. E a gente usava isso.

A primeira página do DIEESE tinha esse cara pintando o “DIEESE 40 anos” e nos botões, nos ícones que não eram botões, eram os tópicos, a gente usava um chapeuzinho, em vez de usar um bullet, uma bolinha. Eram três chapéus, o do jornal que era o cara da construção civil, o capacete do metalúrgico e tinha uma dona de casa também com um lencinho, então, a gente ficava brincando, fazendo vinhetas com esses elementos do Caruso. Era um jeito de darmos uma cara que já era do DIEESE, sem precisar ficar criando, porque era muito difícil. Era uma página toda hierárquica. Aparecia, por exemplo, a Pesquisa do Custo de Vida, mas precisava saber, mais ou menos, do que se tratava, senão você não achava a informação, porque não tinha sistema de busca. E a gente foi colocando as releases desses conteúdos que são, principalmente, das pesquisas permanentes. Releases da imprensa, do ICV [Indice do Custo de Vida], da Cesta Básica.

Criamos uma versão eletrônica do Boletim do DIEESE. Ela já era um pouco melhorzinha, agregava valor no boletim impresso porque tinha hipertexto, você podia mudar. Por exemplo, você tinha várias seções do boletim. Uma coisa é você olhar o boletim e ver seção por seção, outra coisa é você pegar uma seção e ver todos os boletins, tudo o que tinha segundo aquela seção, então esse tipo de facilidade que é própria da linguagem de hipertexto, conseguimos fazer logo na primeira versão. Não lembro quanto tempo ela durou, depois a gente fez uma segunda versão. Ainda tem uns resquícios na nossa página, os bancos de dados foram desenvolvidos com essa segunda versão, e ainda não mudamos. Quanto às cores, nossa página começou com mais vermelho depois virou amarelinho levinho, amarelinho branco, e agora tem mais essa cara azul.

Crises
 

O período de crises do DIEESE foi desgastante porque aconteceu em meio a um cruzamento de interesses do DIEESE com algumas entidades, principalmente as maiores, que começavam a pensar em ter, por exemplo, a sua própria área de assessoria econômica, e isso brigava um pouco com a idéia de subseção do DIEESE que já cumpria esse papel. A outra coisa era que começou a aparecer a idéia de terem a sua própria equipe de formação sindical e o DIEESE já tinha escola sindical. Então, começou a haver questionamentos a respeito dos serviços que oferecíamos, porque o DIEESE por ser intersindical não pode adotar uma [única] visão dentro desse mundo sindical.

As centrais tinham acabado de se constituir cada uma delas querendo implementar sua visão, isso acabava se expressando nesse tipo de desejo [assessoria e formação sindical próprias] das entidades. Houve vários conflitos. Começa aquela história do financiamento para esse tipo de coisa, então você vai brigar por financiamento internacional para bancar a sua escola sindical. Então começa o DIEESE, a CUT, a CGT e tal, a brigar pela mesma grana. Isso começou a causar certa tensão. Então, lá pelo começo dos anos 90, eu acho que enfrentamos o que, para mim, foi a primeira crise, do período que eu estou no DIEESE.

Em 89, fizemos um congresso dos funcionários do DIEESE. Foi um congresso mesmo, de verdade, com teses e tudo. A idéia era que a gente, como funcionário, se dedicasse também a entender aquele momento e como era a relação do DIEESE com as entidades sindicais, dentro desse momento especial. E esse congresso teve desdobramentos que culminaram em mudanças. Teve a saída do [Walter] Barelli, que estava aqui há vinte e tantos anos, e o Serginho [Sérgio Mendonça] foi indicado pela direção para assumir o papel de Diretor Técnico. Mudou a Direção Técnica, mudou a forma de gerir também. Acho que a Direção Técnica não era tão claramente gestora administrativa financeira, era mais gestão técnica. Quando tinha, por exemplo, problemas salariais entre os funcionários, era tudo levado para a Direção Sindical. Nesse momento, isso também mudou, acabou aumentando a atribuição da Direção Técnica para fazer essa gestão também.

Nessa época, no meu setor, foi muito drástico, houve demissões. Estávamos com 17 analistas de O&M [Organização e Métodos] e eles deixaram de ter função após a decisão de acabar com o projeto de informatização sindical. Não sobrou ninguém de O&M e dos analistas de sistemas também. Na época, eu estava grávida e fui preservada. Mas saíram várias pessoas. O Luiz [Luiz Hirano] saiu nessa crise, porque não estava numa posição muito confortável, ele tinha que indicar pessoas para serem demitidas e não topou. O meu setor é o que mais sentiu essa primeira crise. Claro, a gente estava dentro do olho do furacão, o problema do salário também era o trivial de uma crise como aquela. Foi bastante duro. É um momento anterior a uma construção, hoje eu posso olhar e falar: “Bom, de lá pra cá, nesses 16 anos acho que aconteceu muita coisa em termos de co-responsabilidade dos funcionários com a instituição.”

O DIEESE, que era pequenininho, de repente começou a ficar grande, e eu acho que não tinha estofo para conseguir manter, fazer aquilo que funcionava no pequenininho funcionar com um monte de gente. Num momento de crise isso é ainda pior. Você não faz uma construção dessas da noite para o dia, era um monte de funcionários que se entendiam como tal, então teve conflito mesmo. Acho que naquele momento a gente estava brigando por direitos, mesmo. Por isso que teve o congresso do DIEESE. Era uma demonstração de responsabilidade. Agora, é um pouco diferente, apesar de estar grandão [o DIEESE], não dá para dizer que não tenha conflito nem que seja desejável que não exista, mas acho que é diferente. Acho que a co-responsabilidade é muito maior hoje.

 

 

Avaliação/Dieese

 

 

Acho que tem uma defasagem entre aquilo que colocamos à disposição, mesmo sem ser a oitava maravilha do universo, e o uso. E isso, não estou falando só do movimento sindical, é interno ao DIEESE também. Às vezes, a gente dá um pulo sozinho em termos de solução tecnológica. E até preencher com uso isso leva lá uns três, quatro anos.

Não é imediatamente. E gente também não tem fôlego para ficar gerando, porque isso é muito investimento. As pessoas não têm noção de quanto você tem que investir para aquele negócio dar tudo que tem que dar. Porque, às vezes, acontece de colocarmos uma novidade e se todo mundo usar ao mesmo tempo, pode ser que exploda, pode ser que não dê conta. Temos certo conforto para trabalhar, por um lado, de ir ajustando à medida que aquele uso vai se consolidando. E, por outro lado, é uma pena, porque você percebe que, às vezes, quando o uso chega naquele ponto que deveria, você já quer fazer outra coisa, ou aquilo já está quase ficando obsoleto; então tem que dar uma outra solução.

Esse é um problema para nós, porque eu acho que não tem uma aderência muito clara entre o uso de tecnologia e os objetivos do DIEESE, embora ainda exista um desejo, uma vontade ou um reconhecimento de que esse é um caminho que não tem volta. Acho que ainda tem muito que acontecer, acho que mudou muito nesse último ano, realmente houve um esforço enorme em começar a disseminar a informação eletronicamente, principalmente via correio.

Isso já indica uma coisa, porque o correio eletrônico é a primeira aproximação do cara com a internet, e antes de o cara ter proficiência em pesquisa ou em website, ele aprende a usar o correio eletrônico. Esse investimento foi necessário e deu resultado. Eu não tenho dados, mas eu aposto nisso, de que a gente realmente conseguiu dar esse salto agora. Mas acho que o uso da informação que está disponível, ou do bancos de dados, ou da Rede de Apoio [RAN] , ainda vai demorar uns três anos até se consolidar.

Assessoria/RAN
 

A RAN [Rede de Apoio à Negociação] é um portal em que reunimos as informações que dão subsídio às negociações. Por enquanto o acesso é restrito aos autorizados pelas entidades sócias. Na RAN tem, por exemplo, uma base de dados de informações sobre greves, acordos e convenções coletivas, e sobre remuneração. Reunimos interfaces de consulta dessas bases de dados com essa cara web para o usuário final. E também permite ao usuário que faça registros dos processos de negociações de que participa. É um espaço de divulgação e de acesso à informação. Quem tem acesso à RAN pode, por exemplo, pesquisar um acordo com as melhores cláusulas negociadas, isso pode dar base para a pauta de negociação dele. É um espaço de colaboração, de troca de arquivos, de discussão. Tem uma ferramenta de colaboração associada, o PHProjekt, e tem uma série de instrumentos que devem melhorar essa dinâmica de acesso à informação e de divulgação.

 

 

Parceria

 

 

“O Meu Salário” é um projeto internacional bancado por duas universidades holandesas, a Universidade de Amsterdã e a de Roterdã, e a Central Sindical Holandesa [FNV]. A idéia é permitir comparação salarial internacional. Essas universidades desenvolveram uma pesquisa, um questionário que, com suas devidas adaptações, deveria ser aplicado internacionalmente. E qual é a novidade? Essa pesquisa não é por amostra. E com o quê eles contam? Com o volume de informações que é possível obter com o usuário da internet.

Inicialmente, houve um trabalho que tem a ver com a equipe técnica do DIEESE, coordenado pelo Paulo Roberto [Paulo Roberto Arantes do Valle], de adaptação do questionário. Ficamos um ano adaptando o questionário. O aspecto visual da página é do original, é do Wage Indicator Foundation (Fundação Indicador Salarial) lá da Holanda, mas tem algumas variações que você pode adaptar, por exemplo, tem o cabeçalho que é um par de olhos, então tem vários olhares e pode selecionar um para dizer "esse é o do meu país". Mesmo dentro do seu país, você pode ter vários sites. Tem o site específico da mulher, então, o “meu salário mulher”, aí você vai escolher um outro par de olhos para olhar. A diagramação é dada, mais ou menos, por eles. Tem um menuzinho do jeito deles. E, o principal, o que esse site tem que fornecer? Atrativos de conteúdo para um cara que esteja interessado na sua carreira. Na verdade, é um pouco estranho, do ponto de vista do DIEESE, mas é uma novidade, porque nunca trabalhamos do ponto de vista da carreira, que é individual.

O projeto já vem com toda a metodologia, e uma das coisas é que tem que ter um parceiro de mídia. Em geral, um parceiro de mídia é um site de carreira nos outros países, como seria a Catho [agência de empregos] aqui. E para nós também era uma novidade ter um parceiro de mídia. O DIEESE nunca se envolveu em nada parecido. E o que acabou dando uma coisa muito interessante, foi uma parceria com o UOL, que está abrigando o “Meu Salário”, e é legal, porque tem um acordo. Eles têm lá os banners deles, a gente tem uma participação. Se a gente conseguir patrocínio, a gente também muda a relação. Então há uma série de coisas que são novidades absolutas para o DIEESE, em termos, não só de tipo de uso da internet e de possibilidades, mas de financiar pela publicidade um site no ar. O "Meu Salário" vem com muitos desafios do ponto de vista técnico, porque não é fácil fazer essa comparação. Tem muitas dúvidas, muito questionamento interno de certos aspectos metodológicos que a gente ainda está trabalhando. E, do ponto de vista das relações comerciais, vamos dizer, é uma novidade completa.

Estamos aprendendo muito, embora a minha equipe de TI [Tecnologia da Informação] não esteja muito envolvida nisso, damos o suporte necessário. A publicação no site é feita através de um gerenciador de conteúdos que também é deles, quer dizer, a gente realmente só ajuda a usar, a operar e alguns aspectos, tipo serviço de nomes, que a gente implanta, que é nosso. Mas, apesar de não estarmos diretamente relacionados, acho que vai ser uma experiência muito interessante, muito nova.

 

Importância do Dieese
 

Cada vez mais, eu percebo que nos preocupamos em avaliar a importância do DIEESE. Na hora em que fazemos um levantamento de presença na mídia e vemos que existem cerca de 300 notícias por mês - que, na média, dá mais ou menos umas dez por dia - vemos que o negócio existe mesmo e que realmente é importante. Eu aprendi a perceber que também era importante ter uma visão pública, porque tenho uma tendência a achar que o resultado não é uma coisa que necessariamente eu estou olhando. Sei que a sobrevivência também depende dessa visibilidade, desse reconhecimento. Acho que devemos valorizar isso. Para mim, o que mais importa não é isso, porque independentemente da cara com que o DIEESE aparece, eu acho que o que fazemos aqui dentro é muito legal.

 

 

Futuro do Dieese

 

 

O DIEESE tem lugar garantido - se não fizermos muita bobagem, acho que temos chance de continuar no cenário. Eu vejo como bastante importantes as perspectivas que o DIEESE tem. Tem espaço para o DIEESE fazer o que o faz. E depois, faz 50 anos que o DIEESE está aí, com um acúmulo de experiência. Temos história e boas idéias para a frente. Eu acho que estaremos sempre às voltas com essa história de financiamento. Aliás, já é uma discussão se o DIEESE merece ter um tipo de financiamento que é público. Acho que isso é totalmente razoável. Do ponto de vista internacional, temos condições de ter parceiros. Há sempre muita coisa para fazer no mundo. Não é por falta de papel e espero que não seja por falta de grana que deixemos de ocupar esse espaço que, para mim, está garantido.

 

 

Avaliação/Trajetória de Vida

 

 

Eu não consigo me ver num lugar, numa equipe que não trabalhe coletivamente como aqui no DIEESE. É essencial saber ouvir, valorizar a interlocução, conseguir interagir no sentido de que, às vezes, você faz uma coisa e aquilo não necessariamente será compreendido. É essencial levar em conta o olhar do usuário, que é tão importante quanto o teu. E o principal, não ter medo de errar, porque muita coisa que você consegue fazer, faz errando.

 

 

Avaliação/Projeto Memória

 

 

Eu acredito em registro, aliás, se não acreditasse, dificilmente estaria fazendo o que faço que é trabalhar com tecnologia, mas sobretudo com informação. O registro tem que existir independentemente do uso [imediato]. Porque isso vai ser útil em algum momento para alguém e o fato de existir essa possibilidade já justifica, para mim, que se faça.

Uma coisa que eu levantei numa das discussões que fizemos sobre o projeto de memória (que eu achava muito difícil de fazer), eu achava que devíamos tentar registrar justamente as tentativas de processos de gestão que fizemos ao longo desse tempo, porque é um monte de ensaio. Fizemos um plano de cargos e salários com um grupo de 40 pessoas, numa instituição que na época devia ter 200. Ou seja, quando você coloca 40 pessoas para fazer um processo e vira e mexe, então a gente está inventando e desinventando. A gente dá um monte de cabeçada, mas isso faz parte do processo mesmo. E disso, eu acho que seria muito legal ter registros, mas é difícil. Até a documentação é precária, então as pessoas precisam lembrar também.

E quantas vezes você vai pesquisar e não encontra informação? Para mim, memória é isso. Memória é continuidade, é a possibilidade de você ser o mesmo cara de cem anos atrás, ou de mil anos atrás. É você se identificar naquela antigüidade. Acho que se você não tem essa noção de humanidade, o sentido da vida piora um pouquinho. Porque exatamente qual é o nosso problema? O nosso problema é a nossa condição de mortalidade. Se você não faz um fio que reúna tudo isso, aí seu sentido se perde, então viva a memória!

 

Ações do documento