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Clóvis Roberto Scherer

clovis_roberto_schererHistória Temática

Identificação
 

Sou Clóvis Roberto Scherer, nascido em Florianópolis, em 5 de junho de 1963.

 

 

Formação Acadêmica

 

 

Eu sou economista, formado na Universidade Federal de Santa Catarina. Concluí meu curso em 1989. Depois disso, eu fiz uma especialização em programa de pós-graduação em Engenharia de Produção da Universidade Federal de Santa Catarina, na área de Ergonomia, concluída em 1996.

Quando eu entrei na universidade, eu logo de imediato procurei participar do movimento estudantil. Na época, era um período de, digamos assim, ascensão do movimento estudantil, em 1982. Na verdade, eu tinha feito já um ano de Administração numa outra Universidade de Florianópolis, onde eu tive um primeiro contato com o movimento estudantil. Além de que, meus irmãos também eram participantes do movimento. Portanto, quando eu ingressei no curso de Economia, de imediato já procurei acompanhar as atividades do Centro Acadêmico. Depois eu vim a me tornar diretor do Diretório Central dos Estudantes. Da Universidade de Santa Catarina, de 83 a 84. Enfim, sempre tive uma atuação no movimento estudantil.

 

 

Trajetória no Dieese

 

 

Na época em que eu estudava na faculdade, o DIEESE era uma referência para os estudantes, como um centro de, digamos assim, produção de conhecimento crítico à política econômica, ao regime militar, na questão social e trabalhista. Isso foi determinante para uma opção profissional. Quando surgiu o convite, por exemplo, para vir para o DIEESE, para trabalhar no DIEESE, de imediato me interessou. Porque eu tinha o conhecimento da atuação do DIEESE no período em que era estudante. Em Florianópolis, naquela época, chegava muito pouca informação do DIEESE. O que circulava muito, na ocasião, eram matérias de jornal, dados que a imprensa divulgava sobre o custo de vida, sobre o desemprego, declarações do Walter Barelli que repercutiam muito na época, como Diretor Técnico. Isso me chamava muito a atenção. Inclusive os professores utilizavam algumas informações do DIEESE nas suas aulas. Principalmente os professores mais críticos.

 

 

Trajetória Profissional

 

 

TTrabalhei como bolsista na administração da Universidade Estadual de Santa Catarina, Unesc, na Escola Superior de Administração e Gerência. Mas, de fato, tive meu primeiro emprego com carteira assinada como bancário, no Banco Real. Trabalhei lá uns sete, oito meses como bancário, escriturário e ao mesmo tempo em que fazia o curso de economia. Trabalhava de manhã, estudava à tarde, ou vice-versa. Trabalhei no Real cerca de um ano. Não tenho bem precisa essa data, mas foi em torno de um ano.

Aí eu vi que era meio pesado estudar e trabalhar no Banco, porque naquela época se exigia muitas horas extras. E eu tive a oportunidade de ter uma bolsa na Universidade e decide abandonar o emprego. Depois disso, em 84, eu tranquei meu curso na Universidade e fui trabalhar com meus pais, que tinham uma pequena empresa, na administração dessa empresa familiar. Durante algum tempo eu só trabalhei com eles, e depois eu pude retomar os estudos. Voltei para fazer Economia e concluí meus estudos. Mais ou menos na época em que eu estava concluindo o curso, surgiu uma oportunidade de uma vaga no DIEESE.

 

 

Trajetória no Dieese

 

 

No curso de economia, eu estudei com um grande companheiro nosso, que é o Afrânio Boupré, que foi o primeiro supervisor do DIEESE em Santa Catarina. Temos amizade e atuação desde o movimento estudantil. Não só ele, como o José Álvaro, outro dos técnicos do DIEESE, que hoje é supervisor lá no escritório, estudávamos na mesma época. Éramos companheiros de militância. E o meu irmão mais velho, que também estudou economia, estudou contabilidade, também trabalhou no DIEESE. Nessa época, eu tinha contato freqüente com eles, embora estivesse trabalhando lá com meus pais, surgiu essa vaga. Foi em função da pessoa que trabalhava na subseção dos eletricitários, que atendia o sindicato dos eletricitários lá, que estava deixando o DIEESE para ocupar um outro trabalho. E vagou. Eu tinha interesse em exercer a profissão que estava me formando, e sabendo disso, o Afrânio e meu irmão perguntaram se eu não tinha interesse. Era uma substituição que tinha que ser feita muito rápida, me convidaram e eu, imediatamente, aceitei o convite. Comecei a trabalhar no DIEESE na subseção dos eletricitários de Santa Catarina.

Já sabia perfeitamente o que era o DIEESE, que tipo de trabalho fazia, por ter contato com essas pessoas conhecidas, inclusive meu irmão. Conversávamos muito sobre isso. Desde a década de 80, estávamos acompanhando o que rolava sobre política e economia no Brasil e estava lá sempre o nome do DIEESE mencionado. Como eu era economista, óbvio que eu até admirava o trabalho que o DIEESE fazia, achava muito bacana e que eu seria super feliz se pudesse vir trabalhar numa instituição como essa.

 

Subseção
 

Tenho algumas lembranças dos primeiros dias do trabalho no DIEESE. Claro que eu entrei numa subseção, então a primeira coisa foi conhecer o sindicato. O técnico, que era o Serginho, ia me explicando como era o funcionamento, a elaboração de alguns trabalhos salariais, que eram os mais freqüentes. Quase todo mês tinha que se fazer um cálculo das perdas da categoria. Ele foi de imediato me explicar isso. Mas uma das primeiras atividades que eu tive, foi participar de uma reunião das direções dos sindicatos que a subseção atendia. Era um grupo de sete ou oito sindicatos de eletricitários. Era uma reunião importante porque estava se tratando naquele momento do planejamento das ações sindicais na campanha salarial do ano. Eu posso dizer que entrei na subseção no calor da luta. Lembro-me que numa reunião, eu entrando assim, nunca tinha tido um contato mais direto com o movimento sindical, e já de cara, entrei numa plenária. Numa reunião plenária, onde um bando de sindicalistas estava querendo te conhecer, testar teu conhecimento. Fui para a mesa de debates explicar o que acontecia com os salários, o processo econômico, as perdas salariais. Sei que foi um começo difícil, sempre achei que o DIEESE, naquela época principalmente, jogava o pessoal novo no fogo. Se agüentasse ia para frente. Se de cara não desse certo, tinha uma mostra que o funcionário não ia prosperar muito no DIEESE. Ainda bem que eu passei bem nos primeiros testes.

 

 

Assessoria/Negociação

 

 

Logo em seguida, por exemplo, acho que uns 15 dias depois de eu começar no DIEESE, já teve uma negociação com uma das maiores empresas, que era a empresa estatal de energia elétrica de Santa Catarina. E eu fui sozinho para a mesa de negociação, sem nunca ter passado por uma situação semelhante, sem saber exatamente o que ia ocorrer. E ter que debater com diretor financeiro da Companhia, um cara extremamente preparado. E do outro lado, os sindicalistas olhando para o técnico do DIEESE como alguém que tinha que responder a todas as perguntas. Eu sei que fiquei bastante nervoso. Suava frio. (risos) Mas, foi tranqüilo, foi um bom aprendizado.

 

 

Importância do Dieese

 

 

O DIEESE era uma das poucas vozes dissonantes, no debate econômico do Brasil daquela época, ainda de fim do regime militar. De uma política econômica, naquele momento, aplicando um programa de ajustes do FMI, ajuste estrutural para viabilizar o pagamento da dívida externa. Havia uma situação crítica no Brasil de moratória, de crise. E o DIEESE é que fazia o contraponto dessa defesa dos ajustes do FMI e das suas repercussões sociais. Especialmente com a questão do desemprego e arrocho salarial. Isso para a quem tinha como eu, uma visão crítica, era uma das referências que seguíamos para fazer análise e discussão das questões econômicas.

A dificuldade era ter espaço para se manifestar porque havia todo um bloqueio. Se hoje criticamos muitos meios de comunicação pela forma tendenciosa com que abordam certos assuntos, naquela época, o bloqueio da mídia, a pressão do governo, de todo o sistema contra as visões críticas, era muito forte. O espaço na mídia catarinense era muito pequeno para quem tinha uma outra visão que não fosse a das elites que governavam. Isso era a principal dificuldade. E também, obviamente que Santa Catarina, Florianópolis era uma cidade que estava crescendo. Até o acesso a informação, ao debate era restrito. Não se tinha ainda uma sociedade tão aberta como é hoje para tratar os assuntos que naquele tempo eram importantes. Até a própria democratização ajudou a abrir esses espaços que até aquele momento estavam sendo construídos à força.

 

Escritório Regional/SC
 

O DIEESE se instalou lá em 1984, se não me engano. 81 ele foi criado. 83, 84 ele se instala como escritório, depois ele abre algumas subseções, no sindicato dos bancários, sindicato dos eletricitários, depois a Federação no Comércio, Federação dos Trabalhadores da Indústria e depois se reduz novamente. O DIEESE, embora seja uma instituição paulista, tem uma grande repercussão nos estados, principalmente a partir da criação desses escritórios. Lá em Florianópolis, principalmente, a instalação do escritório do DIEESE foi um fato significativo para a sociedade local, tanto no movimento sindical, quanto na sociedade em geral. Porque passa a ter um serviço de assessoria econômica que antes era um privilégio dos sindicatos paulistas. Naquele momento, que era um momento em que os sindicatos em todo Brasil, e não só em São Paulo, estão se fortalecendo, essa expansão do DIEESE vem colaborar bastante nesse processo. A estruturação do processo das negociações coletivas, de atuação sindical. Acho que isso são coisas paralelas, ou seja, o fortalecimento sindical em outras regiões e expansão do DIEESE que se dá em paralelo com isso. E sem dúvida nenhuma, por exemplo, na cesta básica, a divulgação da cesta básica mensal, ela se torna, digamos, uma das notícias importantes que rotineiramente a sociedade local passa a refletir. E é o DIEESE que faz essa inserção. Foi muito importante para a sociedade local que o DIEESE tivesse se instalado lá. E para o movimento sindical, claro, que apóia esse processo de descentralização e de fortalecimento das entidades situadas fora de São Paulo.

Existe uma intensa relação, sempre houve, entre os escritórios regionais e o escritório nacional. De um lado os escritórios se aproveitavam muito do que era produzido aqui, que evidentemente concentrava a produção de análises e de dados que iam abastecer os escritórios. Mas também as equipes regionais, muitas vezes puderam ser partícipes do próprio posicionamento que o DIEESE nacionalmente viria ter.

 

 

Planos Econômicos

 

 

Eu acompanhei, por exemplo, a época da edição dos planos econômicos, de 89, virada dos anos 80 para a 90, a edição dos planos econômicos de combate da inflação, sempre gerava, lá em Santa Catarina, um debate interno da equipe que era repassado depois para a o DIEESE Nacional. E que ajudava a que se tirasse uma avaliação geral dos planos e uma tomada de posicionamento que depois era repassada para os sindicatos. Ia construindo uma avaliação do significado desses planos econômicos para a sociedade.

 

 

Escritório Regional

 

 

Sempre houve essa relação muito intensa, muito estreita, embora cada estado, cada escritório tivesse a sua particularidade, a sua estrutura. Os sócios tinham um perfil de demanda que variava de local para a local. Por exemplo, em Florianópolis predomina a atividade de serviços no setor público. Evidentemente que a temática se modificava em relação a centros mais industrializados. Havia essas características locais.

 

 

Trajetória no Dieese

 

 

Eu comecei na subseção dos eletricitários. Trabalhei de 89 até mais ou menos 1999. Nesse período, em alguma parte desse período, fui supervisor de uma linha chamada eletricitários, que era um grupo de técnicos de eletricitários do país e que se articulava para a produção de estudos setoriais, específicos, dirigidos para essas entidades e também para a Federação Nacional do Urbanitários e para o comando nacional dos eletricitários. Fui supervisor dessa linha. Depois, em 1999, a subseção teve uma redução da jornada de trabalho e eu passei parte do meu tempo a trabalhar no escritório regional. Na seqüência, o Clemente, que é o Diretor Técnico atual, estava lá em Florianópolis. Estava começando o trabalho com o Observatório Social. A partir dos anos 99, 2000, passei a trabalhar para o Observatório. Em 2004, 2005 ainda estava no Observatório e assumi o cargo de coordenação técnica no Observatório. Fiquei trabalhando lá até fevereiro de 2006, quando, a partir de março, fui transferido para o escritório do Distrito Federal onde ocupo, atualmente, a função de supervisor do escritório.

 

Parcerias/Observatório
 

O Observatório Social é um instituto de pesquisa que a Central Única dos Trabalhadores criou em parceria com o DIEESE, com a Unitrabalho e com um outro centro de pesquisa chamado Cedec, Centro de Estudos da Cultura Contemporânea, sediado aqui também em São Paulo. Esse instituto surgiu em 97 e visa fazer pesquisas na área do comportamento social e trabalhista de empresas multinacionais instaladas no Brasil. Na verdade, é um instituto que eu digo que faz uma vigilância social sobre a atuação de empresas multinacionais aqui no país. Ele faz essa vigilância através de estudos, pesquisas, direcionados, esse produto, para as entidades sindicais e sociedade. No sentido de apoiar processos de mobilização em torno das questões que a presença de multinacionais colocam para a comunidades locais, para a categoria de trabalhadores, e a questão ambiental. O Observatório, ele surgiu com sede em Florianópolis, principalmente porque a Central Única tem uma escola sindical localizada lá. Esse projeto foi conduzido, em sua origem pela Secretaria de Relações Internacionais da CUT e pelo então diretor da Escola Sul, que são as pessoas que puxaram a idéia para frente e levaram para Florianópolis a sede do instituto. Depois, mais tarde, em 2005, o Observatório transfere sua sede para a São Paulo. Está localizado hoje aqui no centro de São Paulo.

Embora eu não tenha acompanhado a criação desse Observatório, fui trabalhar lá quando o projeto deslanchou. O que eu sei é que a idéia surgiu a partir do debate sobre a globalização e sobre a adoção de nível internacional da chamada cláusula social nos tratados de comércio internacional. Foi uma proposta lançada por alguns países, Estados Unidos, França, de que houvesse uma obrigatoriedade no sistema de comércio internacional de os países cumprirem os chamados direitos fundamentais do trabalho e outras cláusulas sociais mínimas, sob pena de ter algum tipo de punição ou penalidade pelo não cumprimento dessas normas fundamentais, que são a proteção da liberdade sindical e coletiva, não uso do trabalho escravo, não uso do trabalho infantil e a não discriminação no trabalho. Esses quatro itens que fazem parte da declaração dos direitos fundamentais do trabalho da Organização Internacional do Trabalho – OIT, constituíram o cerne daquilo que se chamou Cláusula Social. No surgimento daqueles debates sobre a adoção ou não dessas cláusulas sociais, a CUT e algumas instituições que vieram formar o observatório, pensaram na necessidade de se ter uma organização que fizesse a avaliação de que se essas condições mínimas estavam sendo cumpridas, primeiramente no comércio regional, do Mercosul, e depois o debate se ampliou para o âmbito internacional. A discussão sobre a necessidade e a oportunidade de uma iniciativa dessas levou a que se constatasse a existência de outras iniciativas semelhantes, mas identificou-se uma lacuna, que era a falta de uma discussão mais aprofundada sobre o impacto das multinacionais nessa questão dos direitos trabalhistas e sociais. Depois de certo tempo de discussões internas se decidiu focalizar o tema das empresas multinacionais e seu comportamento em matéria social, trabalhista e depois se ampliou para a questão ambiental como foco das atenções do Observatório Social. Como a idéia original estava ligada um pouco ao Mercosul, isso foi um dos motivos que justificava e fortalecia a idéia de se instalar o Observatório lá em Florianópolis.

 

 

Pesquisa/Situação do Trabalho no Brasil

 

 

Eu participei de vários estudos de empresas, como o Wal Mart, depois uma outra rede de supermercados do nordeste, a rede Bompreço, na época controlada por uma empresa holandesa. Fiz estudos também sobre um grupo de empresas alemãs do setor metalúrgico e químico, e vários outros estudos pequenos de empresas norueguesas, no setor metalúrgico e de fertilizantes, setor de alumínio e mineração. Enfim, se eu posso dar algumas conclusões sobre todos esses estudos, eu diria que as empresas multinacionais têm uma grande dificuldade em reproduzir no Brasil um padrão de comportamento que elas dizem assumir em suas matrizes. Principalmente no caso das empresas européias, onde a sociedade da sede das empresas estipula padrões muito elevados de conduta dessas organizações empresariais, frente a uma série de questões, inclusive a questão trabalhista e sindical. Isso aqui, quando essas multinacionais vêm para a cá, elas aparentemente absorvem, dizem absorver a cultura local. Elas dizem: “estamos no Brasil, nós temos que nos adaptar à sociedade”. E aqui não existe o mesmo padrão, por exemplo, de relacionamento entre empresas e sindicatos que existe na Europa. Aqui a relação com os trabalhadores e com os sindicatos é uma relação muito mais distante, de menor diálogo social, de maior autoritarismo, digamos assim, de unilateralidade das decisões. E que gera, no final das contas, uma série de problemas mais micro, que se dão na relação de trabalho, no dia a dia do trabalhador. O uso e abuso da pressão sobre o trabalhador, a ameaça da demissão, a imposição de condições de trabalho, de jornadas de trabalho muito mais extenuantes, a freqüente não observância, ou não cumprimento de leis trabalhistas, casos de assédio moral, assédio sexual. E, claro, além de falar de alguns problemas bem significativos do ponto de vista ambiental, como inclusive acidentes, poluição. Uma série de críticas a algumas empresas que não procuram preservar o meio ambiente e mesmo a condição de saúde dos trabalhadores. Nós tivemos um caso de um estudo de uma siderúrgica, uma fundição alemã, numa cidade pequena, no interior do Rio de Janeiro, onde se verificava uma incidência brutal de acidentes e de doenças do trabalho: silicose, alto nível de poeira e de ruídos nas instalações.

 

Observatório Social
 

E o que é uma coisa interessante: o trabalho do Observatório trouxe a tona essa realidade e provocou um interessante processo de discussão do sindicato com a empresa e envolveu inclusive o sindicato da matriz. Por conta disso, a matriz decidiu fazer um programa de investimentos na melhoria das condições de trabalho daquela fundição. O temor que se tinha, originalmente, era de que dada a grave situação da fundição, a empresa decidisse simplesmente fechar o negócio e demitir 1800 trabalhadores. Porque realmente o ramo de fundição é muito competitivo e fazer investimentos na melhoria da qualidade ambiental do trabalho pode prejudicar a competitividade daquele negócio. No entanto, esse esforço de discussão, de pesquisa e de intercâmbio entre sindicalistas do Brasil e da Alemanha, levou que a empresa decidisse encarar de uma maneira positiva e fizesse os investimentos necessários para sanear esses problemas de acidentes e de más condições de trabalho. Esse foi um caso positivo.

Agora, por exemplo, empresas americanas, como o Wal Mart, embora elas aqui sigam a lei e, portanto tenham que cumprir minimamente a legislação e reconhecer os sindicatos, que elas são obrigadas a reconhecer, no entanto são empresas extremamente duras no sentido de abrir-se para um diálogo construtivo com as entidades sindicais. É muito difícil ter um diálogo que vá além daquilo que a lei brasileira obriga as empresas a fazer, que é reconhecer a convenção coletiva, que é reconhecer o direito do sindicato de eventualmente cobrar uma mensalidade. Mas fora isso, há uma distância muito grande, que a meu ver impede a busca de soluções conjuntas.

 

 

Pesquisa/Situação do Trabalho no Brasil

 

 

Os trabalhadores do Wal Mart, assim como de muitas empresas do comércio, eles sofrem de problemas como a lesão por esforços repetitivos, o esgotamento físico e mental em função das jornadas longas, o excessivo número de horas extras e assim por diante. No caso do estudo do Wal Mart, o que tínhamos era uma reclamação muito grande em relação ao não cumprimento das leis que tratam da jornada de trabalho. Jornadas que iam muito além do máximo exigido, que é de 10 horas diárias. Pessoas que trabalhavam muito, além disso, ou que trabalhavam mais dias do que o máximo permitido na loja, em função de que a empresa precisava manter um quadro de pessoal mínimo durante os sete dias da semana. As lojas do Wal Mart funcionam aos domingos e muitas vezes a empresa é obrigada... Quer dizer, obriga os trabalhadores a irem todos os dias sem ter direito a um repouso. Houve casos disso e, no estudo do Wal Mart também, recebemos uma denúncia de uma ex-funcionária que tinha sido pressionada de forma tão intensa ao trabalho, que, dizia ela, motivara até um aborto. Nós encontramos uma série de situações graves e que, no caso do Wal Mart gerou um relatório que foi apresentado à direção da empresa, na expectativa de que se buscassem condições de sanar aqueles problemas. Mas a resposta foi evasiva: “Cumprimos a lei. Se vocês têm algum problema acionem os canais competentes. Com os sindicatos, estabelecemos uma convenção coletiva.” E ponto final. Não houve, como no caso alemão, a busca de uma solução conjunta. Essa é a principal conclusão desse estudo e desse processo que tivemos com o Wal Mart.

Fiz um balanço de 18 estudos que o Observatório fez, por exemplo, com relação à questão da liberdade sindical e negociação coletiva. E a principal característica que distingue o Brasil em relação aos sindicatos das matrizes onde essas empresas atuam, é o fato de não haver por parte dos trabalhadores, condições de uma organização interna nas empresas. Por exemplo, na Europa se têm conselhos, tipo comissões internas nas empresas. Aqui no Brasil, raramente você vê qualquer forma de organização dos empregados dessas mesmas empresas, que os permita abordar os problemas que eles sofrem no dia a dia, de maneira coletiva e organizada para discutir com os seus empregadores. Não existe comissão de fábrica ou comissão de empresas, os dirigentes sindicais encontram extremas dificuldades para se encontrar com os trabalhadores para saber dos problemas e para poder encaminhar a solução. Existem muitas empresas que se negam a dialogar com as entidades sindicais. Essas são as diferenças que eu diria com relação à liberdade sindical e coletiva em relação ao Brasil com os países europeus.

É um trabalho sistemático de pesquisa. Nós pesquisamos as condições de trabalho e as relações sindicais, fazendo o levantamento junto a representantes sindicais, delegados sindicais, representantes de Cipas [Comissão Interna de Prevenção a Acidentes] e trabalhadores sem cargo sindical, sem cargo na Cipa. Fazemos entrevistas, aplicamos questionários, entrevistas qualitativas, além de levantamento de documentos na imprensa, na internet sobre coisas que são publicadas sobre essas empresas. Levantamos um conjunto de fontes e fazemos uma análise qualitativa, mas também houve casos de levantamento de pesquisas quantitativas, e isso gera um relatório.

É claro que há um receio. Quando há uma pressão muito forte, quando a empresa tem um discurso muito opressivo, uma pressão muito grande sobre os empregados, procuramos contornar essa pressão, criando um expediente, por exemplo, convidando para as entrevistas em locais neutros, onde a pessoa não precise se identificar. Mas há também casos positivos de empresas que se abrem à discussão do que ocorre lá dentro. Principalmente empresas que têm um discurso e uma prática avançadas de relacionamento com os chamados stakeholders, as partes interessadas. Hoje, com o discurso da responsabilidade social, cada vez mais as empresas estão vendo que é necessário estabelecer processos de diálogos mais consistentes sob pena até de enfrentar crises, tanto na questão trabalhista, social ou ambiental. E isso levou muitas delas a encarar a possibilidade de serem avaliadas internamente por uma organização não controlada pela empresa, digamos assim, uma organização como o Observatório que era a princípio independente e claramente vinculado a um setor social importante. E assim, nós tivemos várias empresas que se abriram e disseram: “vocês podem fazer o levantamento que vocês quiserem aqui”. Obviamente observando o sigilo comercial da empresa, mas podemos fazer, inclusive, a aplicação dos questionários a amostras estatisticamente representativas do universo de funcionários de seis fábricas, no caso de empresas de capital alemão. Isso nos deu um bom material e permitiu não só conhecer o que ocorre com os trabalhadores daquelas empresas, como, junto com os sindicatos do Brasil e dos países de origem dessas companhias, estabelecer um diálogo social, aberto sobre como se pode enfrentar esses problemas, como se pode construir soluções para algumas das coisas que foram levantadas no estudo.

 

Observatório Social
 

O Observatório se estruturou muito em função da política de relações internacionais da Central Única. A CUT tem relações estreitas, por exemplo, com centrais sindicais da Holanda, da Alemanha, relações também com a Central Norteamericana e através dessas e de outras, da Noruega, da Suécia, não vou citar toda a lista. Mas principalmente no caso da Alemanha e da Holanda, houve um programa de intercâmbio que reuniu os sindicatos do Brasil e desses dois países, que representavam os trabalhadores das mesmas empresas. Foram seis empresas: o Banco ABN, Phillips e a Unilever, da Holanda; a Bosh, a Bayer e a Thyssen, da Alemanha. Fizeram-se estudos nessas seis empresas. Junto com essa elaboração e divulgação desses estudos, se fez um programa de intercâmbio: os sindicalistas do Brasil iam para a Alemanha e Holanda, conhecer a realidade dos trabalhadores desses países, assim como os de lá vinham para cá e visitavam as fábricas. Os sindicatos discutiam os problemas comuns. No fim disso tudo, se procurava fazer reuniões com os diretores das empresas, no Brasil e nas matrizes européias, em cima de pontos que os trabalhadores identificavam como críticos, ou de pontos em que era necessário avançar, melhorar. Problemas que eles enfrentavam e precisavam ser discutidos. Houve reuniões tanto aqui, com a direção dessas empresas no Brasil, como os mesmos assuntos foram discutidos na Alemanha, na matriz da Thyssen, na Bayer, com a direção mundial de recursos humanos. Houve um dos casos uma companhia holandesa de supermercados comprou a empresa Bompreço, no Brasil e no meio desse processo, a companhia holandesa decidiu vender a sua subsidiária aqui. Isso tinha um impacto potencial no emprego, porque punha em risco o emprego dos funcionários do supermercado no país. Essa questão foi levada para uma reunião na Holanda, entre os sindicalistas brasileiros, holandeses e a direção mundial. O diretor mundial de Recursos Humanos assumiu compromisso com os sindicalistas brasileiros quanto à manutenção dos empregos no país. Esse é o tipo de diálogo social que no final, o Observatório Social sempre procurou alcançar. Exemplo dessa fundição alemã, o objetivo era exatamente isso: levantar os problemas para que esse estudo resultasse na busca de uma solução para tais problemas.

Ele passa por mudanças negociadas. No caso da fundição, investimentos na melhoria das condições do ambiente de trabalho que aliviasse os trabalhadores daquela poeira que encontravam, do ruído que encontravam no dia a dia do seu trabalho. Claro que no final tem que ter alguma coisa concreta lá na ponta. Mas, isso passa pela construção de um processo de diálogo muito complexo, que envolve, no caso de multinacionais, decisões em dois ou três países, a mobilização de atores sociais em diferentes continentes, com idiomas, realidades completamente distintas. Os sindicalistas brasileiros vão para a Europa e não entendem nada do que acontece, porque é uma realidade completamente diferente, assim como os alemães, holandeses vêm para a cá e caem num país como o nosso e vêem que a realidade, embora existam pontos comuns, é completamente distinta.

 

 

Educação/Formação Sindical

 

 

Quando traçamos esses planos de ação, essas pesquisas, isso está sempre casado a um processo em que os sindicalistas vão conhecer sua própria realidade. Ao fazer pesquisas, não fazemos para publicá-las ou botar na estante, mas para sistematizar informação que, muitas vezes, está dispersa no próprio meio sindical. Empresas que têm 13, 14 fábricas no Brasil, às vezes o sindicalista que representa uma fábrica não conhece o que está acontecendo numa fábrica de um estado vizinho. Procuramos, ao fazer esses levantamentos, ter atividades que reúnam os sindicalistas, para que eles troquem informação, conheçam a informação sistematizada pelos pesquisadores e possam, com isso, melhorar sua interpretação da vida e da realidade do pessoal que eles representam. Eu participei, por exemplo, de um estudo bem curto sobre uma metalúrgica alemã que fabrica autopeças, e no Brasil ela tem umas quatro ou cinco fábricas. Os trabalhadores brasileiros não conheciam nada das fábricas a não ser a sua, como não conheciam nada do grupo alemão que controlava a empresa. Principalmente, não conheciam a estratégia, os problemas que o grupo ao nível internacional enfrentava, inclusive a realidade que os trabalhadores desse mesmo grupo enfrentavam em outros países. Eles nem sabiam que a empresa tinha fábricas na Índia, na China, nos países do Leste Europeu, na Polônia e que isso estava, esses investimentos do grupo multinacional estavam afetando a vida de todos, não só dos trabalhadores alemães mas também aqui dos brasileiros. Acaba sendo uma atividade de formação do conhecimento que o dirigente sindical, principalmente, tem sobre a empresa com a qual ele negocia, discute os problemas da sua base. E ajuda ele a formar uma visão de estratégia mais global. Quando falamos em multinacionais, o cara tem que perceber uma dimensão global dessas empresas. Trazemos, junto com isso, um pouco de formação sobre que ferramenta um dirigente sindical que atua junto a uma multinacional pode lançar mão nas suas estratégias de ação. Por exemplo, temas de responsabilidade social das empresas, códigos de conduta, os mecanismos internacionais de denuncia, de mobilização, as normas internacionais do trabalho, isso aí faz parte de um programa de formação que ocorre ao longo das atividades do Observatório. E também informação temática, porque como focalizamos alguns temas centrais, como esses quatro direitos fundamentais do trabalho, questão da saúde e segurança, volta e meia o Observatório programa atividades temáticas para capacitar os dirigentes, ou debater com os dirigentes temas relacionados com esses assuntos. Por exemplo, a questão da segurança; a responsabilidade social, a discriminação do trabalho, questão de gênero, de raça. Isso acaba fazendo parte das atividades do Observatório. Mas, o objetivo principal não é tanto a formação, e sim a pesquisa, geração de informação voltada para a ação. É um instituto de informação. Inclusive a Central Única tem um departamento de formação específico, com formação de dirigentes e tudo mais.

 

Pesquisa/Observatório
 

O observatório tem uma metodologia de estudo das empresas. Ela se baseia muito numa avaliação qualitativa das condições de trabalho. Essa metodologia, em alguns casos, ela foi desenvolvida até ao nível de um detalhamento mais de pesquisa de opinião, digamos assim, do trabalhador, para encarar alguns temas como discriminação no trabalho. E hoje, o Observatório já discute metodologia de avaliação de empresas, numa rede latino-americana de institutos similares. Ele participa de uma rede com outros institutos do Chile, Peru, Argentina e em alguns outros países, Colômbia, Equador, para socializar e discutir metodologias comuns que possam avaliar multinacionais que atuam no continente. Esse é um dos trabalhos importantes, internos do Observatório de desenvolvimento metodológico de análise da conduta empresarial.

Quando falamos com empresários ou mesmo com técnicos da academia ou de órgãos governamentais ou não governamentais, as pessoas que trabalham no DIEESE, normalmente absorvem a idéia de que estão falando em nome de uma organização ligada aos trabalhadores. A sua perspectiva, para abordar qualquer assunto ela se condiciona nesse enfoque. Se eu dialogar com um empresário, onde a relação é mais dintante, diria, não há problema, porque eu sei que estou falando de um ponto de vista que precisa se constituir de maneira diferenciada em relação ao empresário. Não tenho que tentar falar a linguagem do empresário, ao contrário, eu tenho que falar a linguagem daqueles ao qual eu estou vinculado como organização, de maneira que o outro lado entenda essa perspectiva. Talvez esse seja o desafio, como falar para a alguém que tem uma cabeça que não é de trabalhador. Mas eu não preciso me preocupar se eu vou perder o norte que guia o discurso. Isso está muito claro. Todos que estão no DIEESE têm muito claro isso.

 

 

Técnico X Sindicalista

 

 

É uma relação às vezes tensa, existem pontos de tensão. Mas, no geral, é uma relação muito cooperativa, solidária. Embora sempre haja uma tensão ou outra, porque os sindicalistas têm uma perspectiva sobre o que se vai falar como técnico, se interessa a ele quando se está falando algo que agrada o ouvido: “as minhas perdas são altas, vou reivindicar um monte, vou para a campanha pedir 20% porque o técnico do DIEESE está dizendo exatamente o que queremos.”. E, às vezes, temos que chamar o cara à atenção para a certos aspectos que ele não considerou e pode não se encaixar perfeitamente na estratégia dele. Esses momentos de tensão surgem. No geral, acho que os dirigentes sindicais dão muito apoio ao técnico do DIEESE, dão muito respaldo. Acho que em todas as ocasiões em que eu estive em situação de precisar apoio do movimento sindical, dos sindicalistas, no geral eu recebi. Poucos foram os momentos em que eu tive que me confrontar com alguma pessoa do meio sindical. Bem poucas mesmo. E sempre houve companheiros que vieram defender o DIEESE, tal. Existe uma grande identidade ideológica entre os dirigentes sindicais e o DIEESE. Os dirigentes sindicais reconhecem o DIEESE como seu e por isso eles apóiam mesmo que em alguns momentos tenhamos que dizer coisas que não sejam exatamente o que eles gostariam de ouvir. Eles respeitam, reconhecem e eu acho que isso é positivo. De outro lado, os dirigentes sindicais colocam também suas questões para o DIEESE, em termos de orientações que eles acham que seriam importantes o DIEESE seguir para atender demandas suas. Chamam e dizem: “Vocês não estão analisando profundamente tal questão, nós precisamos que vocês nos digam algo sobre tal assunto.” Eles dão uma boa orientação e apoio. No geral, recebemos um grande apoio.

Hoje nós estamos num bom momento. Não é uma linha uniforme, tem altos e baixos. Em momentos de crise do próprio movimento sindical, surgem também as tensões para o lado do DIEESE. Aumentam. Quando por exemplo o movimento sindical precisa de um rumo e esse rumo não está muito claro. Acho que a década de 90 foi muito isso, para a mim pelo menos, no meu posto de trabalho. Os sindicatos da categoria a qual eu atendia estava num momento de crise em função da privatização do setor elétrico, redução de quadro, enfrentamento de políticas neoliberais que estavam se impondo naquele momento, redução de direitos, retiradas de cláusulas previstas em convenções coletivas e não havia um rumo claro, uma luz no fim do túnel. Evidentemente que surgia um maior questionamento do porquê o DIEESE não era mais incisivo nesse momento de luta, por que não se posicionava tão alinhadamente com o que eles queriam, e tal. É natural, porque quando a coisa está pegando fogo, a tensão aumenta para a todo mundo e aumenta para a nós. Hoje, eu acho que o movimento sindical, pelo menos para o DIEESE, por estar numa fase relativamente melhor do que esteve nesse período que eu me referi, acho que há uma maior identidade. O DIEESE volta a ser uma grande arma para as entidades sindicais.

 

Importância do Dieese
 

O DIEESE é um nome bem ilustre na sociedade. E quando se fala do DIEESE, se fala com muito respeito. Inclusive agora, recentemente, eu estava na negociação de uma categoria de distribuição de gás liquefeito de petróleo. Do outro lado da mesa, a bancada patronal, para usar um argumento que nos colocava numa situação um pouco complicada, questionava nossa posição, usava com a boca cheia os dados do próprio DIEESE. Eles mesmos com isso estavam reconhecendo a idoneidade do DIEESE e a validade dos dados que produz. Claro que faziam a interpretação que queriam com os nossos dados e foi isso que tivemos que esclarecer, porque a interpretação não estava bem correta. Isso mostra que até o lado patronal, que se esperava deveria estar tentando tirar nossa credibilidade, não. Pautava-se na nossa credibilidade para poder nos questionar, nas nossas reivindicações. Isso é um exemplo. A própria cobertura que a imprensa dá. O destaque que ela dá para os nossos estudos e pesquisas, acho que são um bom indicador de como a sociedade vê o DIEESE com bons olhos e respeito pela sua produção técnica.

 

 

Trajetória de Vida

 

 

Eu não só saí de Florianópolis para a Brasília, que são duas realidades bem distintas, como mudei de posto de trabalho, dentro do DIEESE. A minha avaliação dessa mudança: Florianópolis é uma das cidades com maior qualidade de vida e a capital de um estado que tem menos desigualdade social. Enquanto Brasília, apesar de ter um alto índice de IDH, renda per capta altíssima, tem uma desigualdade social gritante. Existe o plano piloto e as cidades satélites. À medida que vão se afastando do plano piloto, a qualidade de vida vai caindo muito. Isso para a mim é muito impactante, porque é realmente uma realidade bastante diferente da qual eu vivia. E acho que Brasília é um exemplo dos problemas e desafios que o Brasil tem para atender às necessidades e desejos da população. Quando puder reduzir aquela situação lá, eu acho que o Brasil vai mostrar que está avançando para um lugar civilizado.

 

 

Trajetória no Dieese

 

 

E com relação ao posto de trabalho, eu fiz uma mudança, porque estava muito focado na questão das multinacionais e pesquisas e agora estou no atendimento sindical, feijão com arroz, das questões locais, e talvez assim de volta a um outro lado da questão sindical que eu tinha me afastado por alguns anos. É importante isso. O escritório de Brasília é um dos mais importantes para o DIEESE pelo tamanho das entidades que são sócios lá, tem muitas federações nacionais e confederações nacionais que são sócios do DIEESE e demandam trabalho regional. Isso implica que as demandas são de grande repercussão e exigem uma qualidade técnica elevada. Quando tu entrega um trabalho para a uma Federação daquela, essa federação vai distribuir esse trabalho para o Brasil todo. Tudo que tu fizer ali vai correr o Brasil na mão dos dirigentes sindicais. Isso para a mim aumentou muito a responsabilidade e, como falei, me colocou numa temática que eu tinha me afastado um pouco. Estou retomando temas que eu não estava mais trabalhando há alguns anos. É um dia a dia muito mais puxado, mais correria para atender demandas no dia seguinte. No Observatório tinha uma pesquisa, um planejamento, levava meses, ia acontecer alguma coisa lá na frente. Ali não. Amanhã tem uma negociação, tu tem que fazer um estudo, trazer um novo argumento. Além de que o número de demandantes é muito maior. São 36 sócios, tem a imprensa local, a imprensa em Brasília é forte. E o escritório é responsável pela pesquisa de emprego e desemprego no Distrito Federal. Essa situação também é nova para a mim.

 

 

Avaliação/Trajetória de Vida

 

 

Não saberia dizer se eu tenho uma principal lição. Eu aprendi muito no DIEESE. O DIEESE me ensinou muita coisa para a vida: como lidar com problemas complexos, como lidar com situações de decisão rápida. Também na parte técnica, eu acho que minha formação como economista foi até um ponto e o DIEESE me deu o resto. Isso tudo é um ganho que eu tenho que creditar ao DIEESE. Oportunidades também que me foram abertas: nesse trabalho do Observatório Social, eu pude também ter contato com a realidade internacional, as discussões internacionais. Uma dimensão muito importante para a mim. Enfim, um aprendizado humano e profissional bem rico. Não saberia te dizer uma lição do DIEESE, não parei para pensar nisso ainda. São tantas lições, que não saberia dizer uma apenas.

 

Avaliação/Projeto de Memória
 

Eu acho ótimo. Porque é uma parte da memória do movimento sindical que está aí. Eu acho isso fundamental. Um povo sem memória, um povo sem registro histórico, não consegue olhar o seu futuro. E eu acho que o DIEESE cumpriu um papel tão importante no apoio ao movimento sindical, no movimento dos trabalhadores - que são a parcela majoritária da população - que ele precisa ter seu lugar guardadinho tal, como histórico, como uma coisa que as pessoas possam recorrer sempre que precisem relembrar os fatos que viveram. E esse trabalho todo que foi feito, precisa estar conservado, precisa estar bem acessível para a quem precise desse conhecimento todo. Se não, ele se vai. Outro dia estava vendo material histórico do escritório, arquivos velhos, e vi toda série de boletins que o escritório escreveu desde a sua criação, desde o momento que o primeiro técnico foi trabalhar lá no escritório. E ali está todo o registro do processo econômico visto sob a perspectiva dos trabalhadores do Distrito Federal. Isso é um registro que eu imagino que em Brasília não vai haver outro igual. Nenhum sindicato que eu conheça teve talvez a oportunidade de conservar sua memória assim como o DIEESE está fazendo. Talvez esse trabalho possa realmente conservar não só a memória do DIEESE, mas uma parte da memória do movimento sindical brasileiro que vai estar guardada, preservada para o futuro. Eu trabalhei num sindicato, que eu assessorei lá na subseção, que eles fizeram um trabalho histórico. Não sei se foi aos 25 anos ou 35 anos de história do sindicato, eles fizeram, contrataram historiadores que foram fazer um registro histórico dos documentos daquela entidade e desde aquele momento eu vi a importância que isso tem para a sociedade. Não só para a categoria que está ali diretamente envolvida, mas para a outras categorias que precisam refletir sobre alguns processos que aquele sindicato passou, a comunidade acadêmica poder fazer uso daquele conhecimento. Isso acabou se definindo. É muito importante e foi muito oportuno agora aproveitando os 50 anos. Lá no escritório estamos fazendo 25 anos de existência e temos que aproveitar essa ocasião.

Eu acho que para o DIEESE pode significar, pela primeira vez, principalmente para o pessoal mais novo, uma retomada de velhas idéias, da evolução, de como nós chegamos aqui. Talvez isso nos dê elementos para pensar o futuro. O pessoal mais antigo já sabe toda a história. O pessoal mais novo, talvez não. Mesmo para nós, que estamos há muito tempo, é sempre bom ver de onde viemos; fazer um balanço desse período. Acho que o balanço será positivo e poderá injetar novo ânimo. Eu lá, por exemplo, falo, partilho concretamente da minha situação, que fui encontrar um escritório com 25 anos e estou chegando novo no escritório. Ao relembrar essa história foi muito bom, para ver o que os supervisores fizeram e qual foi a experiência, um pouquinho da experiência que eles tiveram para poder me situar um pouco. Porque é óbvio que eu estou indo para um escritório que tem uma bagagem, que tem uma história. Se eu me fizesse de cego para a esse passado poderia quebrar a cara na primeira, fazer uma coisa que já, sabidamente, não vai dar certo. Ao começar a acompanhar o andamento do Projeto Memória 50 anos, e ao contribuir reunindo material, vendo material antigo, eu pude ter contato com essa história e é, está sendo e vai ser muito importante para a eu não cometer erros e aproveitar os acertos que já foram feitos. Tem já boas dicas, orientações do pessoal mais antigo e está sendo muito bom.

Estou gostando muito disso por esse motivo que acabei de dizer: está me ajudando diretamente na minha atividade lá. Ter falado aqui sobre esses anos, 17 anos no DIEESE, daria para complementar com outras coisas. Vai ser muito bom ter esse registro, porque parte dele eu vou poder ter e sistematizar. Daqui a alguns anos não vou precisar ficar pensando muito sobre o que realmente aconteceu naquela época. Tem um outro, só queria complementar essa história, não sei se vocês vão entrevistar outros funcionários do DIEESE que trabalharam nas linhas, eletricitários, bancários, e tal. Essa é uma história muito interessante, que eu tive oportunidade de acompanhar na década de 90, trabalhando com um grupo de profissionais de um setor que enfrentou uma grande dificuldade que foi todo o ajuste neoliberal, o impacto que isso teve para os sindicatos e para os trabalhadores. Esse é um momento importante no DIEESE na década de 90, porque ter passado por essa década de 90 nos permitiu, acho, enfrentar os anos atuais com mais resistência. Criamos uma couraça que nos dá fôlego para pensar que o futuro não vai ser tão ruim como foi o passado, desses anos 90. Bom, é muito legal falar um pouco dessa memória.

 

 

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