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Nelson de Chueri Karam

nelson_de_chueri_karamHistória temática

Identificação
 

Chamo-me Nelson de Chueri Karam, nasci em Curitiba, em 1959.

 

 

Formação Acadêmica

 

 

Ingressei na Universidade Federal do Paraná em 1977 e me formei em Economia no final de 1980. Depois fiz mestrado com especialização em desenvolvimento regional e urbano, na Universidade Federal de Minas. Fiquei um ano e meio morando em Belo Horizonte, conclui os créditos do mestrado e retornei para Curitiba.

 

 

Trajetória Profissional

 

 

Meu primeiro trabalho, minha primeira atividade profissional foi auxiliando meu avô. Ele tinha uma um estabelecimento comercial e eu o ajudava. Fazia pagamentos de bancos, ajudava um pouco nas vendas. Foi aí que eu descobri um pouco minha quedinha pela economia. Isso em 1974, minha primeira atividade. Antes de entrar no DIEESE, eu morava em Curitiba e trabalhava no Governo do Estado. Eu trabalhei no IPARDES [Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social], que é um instituto de pesquisa e planejamento. Eu trabalhava no setor responsável pela análise da conjuntura econômica. Produzia estudos sobre diferentes temas da economia paranaense. Este trabalho me possibilitou o exercício de minha atividade enquanto economista. Eu fiquei menos de três anos no IPARDES e por alguns problemas funcionais fui convidado a me retirar do órgão. Fui transferido para uma outra entidade pública que fazia coordenação dos estudos metropolitanos da região de Curitiba. Mudei um pouco meu foco ali, para uma análise mais de desenvolvimento regional. Fiquei um ano e meio e depois saí para fazer um curso de mestrado em Belo Horizonte.

 

Trajetória no Dieese
 

A primeira vez que eu ouvi falar no nome do DIEESE, foi quando eu estava no curso de Economia. Recordo-me muito bem disso, o professor de Introdução à Economia logo no primeiro ano, falou: “Existe em São Paulo, uma instituição que faz pesquisa e desenvolvimento para o movimento sindical.” Ele falou o nome do DIEESE e eu fiquei com essa pulguinha atrás da orelha,ao longo de todo o meu curso. Logo que eu me formei, fui trabalhar no Estado e alguns anos depois houve um processo de seleção para trabalhar junto a uma entidade sindical no Paraná. Desta forma eu ingressei no Dieese.

Eu completei, em 1º de outubro de 2007, 21 anos de DIEESE. É um período muito longo e eu não me esqueço nunca, porque uns dias antes de eu entrar no DIEESE, minha filha nasceu. Meu período de DIEESE é o período de vida dela. Eu iniciei meu trabalho no DIEESE, numa subseção junto à Federação dos Bancários do Paraná, em 1986. Participei de um processo de seleção, fui contratado e comecei a trabalhar nessa entidade sindical, que era uma federação que congregava vários sindicatos de bancários do Estado. Ali comecei a desenvolver uma série de trabalhos sobre o setor financeiro, acompanhar as negociações dos bancários em nível regional e nacional.

Na verdade, eu tinha comigo uma opção de trabalhar para um segmento da sociedade. Desde o momento em que eu tomei contato com o DIEESE,, sempre foi meu desejo vir a trabalhar, desenvolver estudos para a classe trabalhadora. E uma coisa que me incomodava muito na Universidade, e daí a minha busca pelo DIEESE, era a vontade de estar conciliando também todo aprendizado teórico com a prática. Eu enxerguei no DIEESE essa possibilidade de você produzir conhecimento e oferecer, trocar todo esse conhecimento com a classe trabalhadora. Ver esse conhecimento, na verdade, poder estar se espelhando na realidade, interferindo numa realidade. Foi isso que me mobilizou nesse período anterior a entrada no DIEESE.

Entrei como técnico da subseção de bancários do Paraná. Trabalhei de 1986 a 1991 como técnico dessa subseção, fui um dos coordenadores do que na época se chamava Linha Bancários. Fui coordenador de uma equipe de técnicos de subseções que trabalhavam junto a entidades sindicais de bancários. Posteriormente a esse trabalho na subseção, eu fui convidado a ser o supervisor do escritório regional do DIEESE, no Paraná. Exerci esse cargo de supervisor até meados de 1995 quando deixei a supervisão do escritório do Paraná para fazer um curso de especialização em qualidade e produtividade, a convite do movimento sindical. Retornei às atividades normais de trabalho do DIEESE como membro da equipe de educação, em 1998. Fui por muitos anos técnico da equipe de educação do DIEESE. No final de 2001, o DIEESE começou a estruturar um projeto de capacitação de dirigentes e assessores sindicais, e eu fui convidado a coordenar uma parte desse programa que previa o desenvolvimento de um material de apoio pedagógico para atividades de formação sindical, que veio a ser conhecida no DIEESE e no movimento sindical como Kits de formação sindical. Eu coordenei de 2002 até 2004 o desenvolvimento desses kits. Na verdade, nos últimos anos, antes de assumir a coordenação de relações sindicais, eu estive muito vinculado a todas as atividades de educação do DIEESE.

Quando houve o convite para eu coordenar a produção desses kits eu mudei de Curitiba para Florianópolis, porque o coordenador geral do projeto, o Clemente, que hoje é o Diretor Técnico morava em Florianópolis. Esta mudança, portanto, facilitaria a coordenação e articulação das atividades do projeto. Então, saí de Curitiba e fui para Florianópolis onde resido até hoje . Em junho de 2005 fui convidado para assumir a coordenação das relações sindicais, atividade que venho exercendo desde então, trabalhando uma semana em Florianópolis outra em São Paulo.

Coordeno hoje o trabalho realizado pelos 16 escritórios regionais do DIEESE e subseções - que são as unidades do DIEESE dentro das entidades sindicais - com o objetivo de planejar e articular toda essa produção que é realizada pelos escritórios regionais e pelas subseções, com as demandas de trabalho das entidades sindicais. Todo tempo eu estou sendo desafiado a fazer esse papel de articulador. E num quadro de muita complexidade e adversidade, o que é extremamente positivo do ponto de vista da realização do trabalho.. Fazer a articulação desses trabalhos sabendo que você vai dialogar com entidades sindicais, centrais sindicais que têm pensamentos diferenciados, leituras diferenciadas sobre a realidade, mas têm muitos pontos de convergência. Articular o desenvolvimento destes trabalhos, através de uma equipe multidisciplinar e presente em vários estados, com as diferentes demandas sindicais é o desafio permanente da coordenação de relações sindicais: identificar demandas de trabalhos vindos das entidades sindicais e oferecer um produto, um serviço que esteja de acordo com as necessidades das entidades sindicais.

 

Técnico X Sindicalista
 

Creio que o rico do trabalho do DIEESE é exatamente esse: a oportunidade de conciliar esse trabalho técnico com o desdobramento na ação de um ator social. É diferente, por exemplo, de um trabalho na academia, onde você fica muito vinculado às discussões mais teóricas. Mesmo no próprio Estado, às vezes pela limitação das conjunções políticas que se estabelecem, a tua capacidade de interferir produzindo conhecimento para um governo é sempre mais limitada. E no caso do DIEESE, a natureza do trabalho te escancara, te abre mais essa oportunidade de fazer esse duplo papel. Isso é o que dá sentido ao conhecimento técnico e ao teórico, que é ao mesmo tempo você estar produzindo conhecimento e estar ali conversando com um dirigente sindical, orientando, buscando passar algumas orientações, algumas pesquisas que possam estar alavancando a ação cotidiana dele e, também, aprender com ele. Esse é um dos aspectos mais importantes e interessantes e é o que dá muita vida e muita vontade de trabalhar numa instituição como o DIEESE.

Os eixos de trabalho do DIEESE são a pesquisa, a assessoria e a educação. Ao longo dos últimos anos vimos construindo a idéia de que o técnico do DIEESE deve ter a capacidade de trabalhar com essas três dimensões, com esses três eixos. Não deveria ser um técnico especialista só em educação, só em pesquisa ou só em negociação. Pela minha trajetória no DIEESE, acabei tendo a oportunidade de tomar contato com essas dimensões. Meu trabalho de subseção foi muito voltado para a negociação, um pouco de pesquisa. A dimensão da pesquisa esteve mais presente no trabalho do escritório. E depois essa minha inserção nas atividades de educação. Isso me deu um conhecimento institucional e uma possibilidade de assumir essa coordenação, tendo essas três dimensões integradas na minha forma de trabalhar. Isso me ajudou muito. O fato de eu conhecer um pouco a realidade dos escritórios regionais, ter sido técnico de subseção e ter tido essa experiência de educação, me facilitou esse desafio de trabalhar na coordenação de relações sindicais, que é uma coordenação que, na verdade, está o tempo todo vivenciando essas três dimensões de trabalho do DIEESE.

 

 

Educação/Formação Sindical

 

 

Já em 94, o DIEESE iniciou um grande programa de capacitação de dirigentes e assessores sindicais, batizado de PCDA. Eu fui aluno e também depois vim a ser coordenador de uma das turmas.. Apoiei a formatação desse programa de capacitação, trabalhava alguns conteúdos temáticos e sempre estava envolvido no desenvolvimento de seminários sobre diferentes temas para o movimento sindical. Naquela época, o DIEESE realizava mais os seminários voltados para a negociação coletiva, que apoiavam a preparação do dirigente sindical para fazer a negociação coletiva. Eu participei em boa parte dessas atividades. Quando a agenda sindical começa a mudar na década de 90, quando os sindicatos começaram a discutir outros temas além da questão salarial, ou mesmo ampliando a discussão em torno da remuneração, introduzindo a discussão sobre participação nos lucros e resultados, produtividade, eu ajudei também na elaboração de conteúdos pedagógicos para essa nova agenda do movimento sindical. E, mais recentemente, eu tive a oportunidade de ter um contato mais estreito com a área de educação, através do desenvolvimento desses 18 kits de formação sindical, onde teve um trabalho intenso de discussão de concepção pedagógica. Porque o DIEESE tem toda uma história relacionada com a educação, que rompe um pouco com os padrões tradicionais de se fazer formação sindical. Por isso que eu uso o termo professor entre aspas porque não , no trabalho da educação, essa relação com o dirigente sindical. Porque uma das concepções que orientam o trabalho de formação do DIEESE é que o conhecimento está presente em todas as pessoas. O mediador ou a pessoa que está ali conduzindo a atividade de formação, na verdade, tem que abrir oportunidade para que esse conhecimento apareça no grupo, seja trocado, seja reconstruído.

 

Educação/Kits Temáticos
 

O processo de construção desse material foi também interessante, porque, na verdade, construímos junto com os dirigentes sindicais. Inicialmente, fizemos uma consulta junto ao movimento sindical para saber quais seriam os temas de interesse para que viéssemos a organizar nesses seminários. Eles indicaram os temas e todo o processo de construção foi feito em parceria com as entidades sindicais. Fazíamos uma elaboração prévia do conteúdo dessas atividades e depois algumas experimentações junto com as entidades sindicais, para ver se estava de acordo com os anseios delas. O processo de construção sempre foi de muita parceria. Creio que isso, somado a forma com a qual o DIEESE trabalha a educação, têm dado, na nossa avaliação, excelentes resultados.

Lógico que um conjunto temático desses, 18 seminários, nem todos são sistematicamente utilizados, ou têm um uso cotidiano mais freqüente. Mas, boa parte deles tem sido usado com freqüência pelo movimento sindical. A aposta que fazíamos nesse material - e isso também está relacionado com a forma como pensamos educação - era de que elaboraríamos esses seminários, indicando um percurso para se fazer a conversa sobre um determinado tema. Mas que isso depois pudesse ser apropriado pelo próprio dirigente sindical e ele mesmo fazer o processo de formação de tal modo que prescindisse do técnico do DIEESE ou do especialista em educação para poder executar essa atividade. Nossa estratégia foi de buscar junto ao movimento sindical aquelas pessoas ou aqueles dirigentes que trabalhavam com formação, contar toda essa trajetória de produção desse material, da concepção pedagógica que estava por trás disso e oferecer através desse diálogo à oportunidade para que esse dirigente pudesse, ele mesmo, realizar essas atividades de formação. Eu diria que esse resultado ainda está muito insipiente, porque coincidiu exatamente num momento de restrições financeiras às escolas sindicais e as atividades de formação nas entidades sindicais, o que acabou reduzindo a possibilidade de descentralizar e dar maior capilaridade as atividades de formação. Existem algumas iniciativas sindicais, que atestam que isso é possível, mas a amplitude nesse momento ainda não foi a que imaginávamos. De modo geral, a experiência está sendo bastante reconhecida. São mais de 400 horas de formação que estão à disposição do movimento sindical.

 

Pesquisa
 

Olhando para a história dos trabalhos do DIEESE, temos períodos bem demarcados, o que inclusive orienta o trabalho da coordenação hoje e orientaram no passado. Tivemos a década de 80, marcada por uma grande discussão na agenda sindical, que era a discussão em torno da reposição salarial. Boa parte da agenda sindical, no período da década de 80, estava dominada por essa discussão dos reajustes salariais, que tinha a ver com a conjuntura da época: inflação alta, planos econômicos que sumiram com boa parte dos reajustes de salário. As atividades da coordenação que cuidava das subseções e escritórios, estava muito focada nessa agenda. Na década de 90, essa agenda começa a se ampliar um pouco mais. Outros trabalhos, outras demandas do movimento sindical, fruto da nova conjuntura econômica. O PCDA, por exemplo, surge da necessidade do movimento sindical entender o processo de reestruturação produtiva que as empresas estavam passando. Isso já colocava um outro ponto na agenda nacional. A década de 90 é uma década de ampliação da agenda de negociação sindical. O foco exclusivo da negociação salarial passou a ser combinado com outros temas, por exemplo, emprego. A questão do emprego aparece muito forte e os programas do DIEESE, da coordenação, vão estar muito voltados para atender essas questões relacionadas ao mercado de trabalho, a da reestruturação produtiva, que são temas novos que vão entrando na agenda. Na era dos anos 2000, a ampliação da agenda se confirma e sinaliza o que vai se firmar dali em diante. As entidades sindicais demandam ao DIEESE pesquisas no sentido de oferecer ter um conhecimento mais detalhado sobre o setor em que a entidade sindical representa. Somos chamados a fazer análise de desempenho de setores, de empresas, com muito mais freqüência do que fazíamos no passado. Como houve um processo também de renovação muito acentuado das lideranças sindicais, há uma necessidade hoje de as entidades sindicais conhecerem a categoria. Crescem as demandas de trabalho ao DIEESE para realizar estudos sobre o perfil de categoria. As entidades sindicais querem conhecer quem é essa base que representam, em parte porque houve uma renovação das lideranças sindicais, em parte porque também houve uma mudança no perfil da categoria. Essa agenda temática vai se ampliando para questões mais focadas para categoria e também para questões, e eu acho que aí sinaliza um pouco para frente, de uma relação que começa a se estabelecer mais forte entre as entidades sindicais e os interesses gerais da sociedade. Você tem uma conjugação de demandas de trabalho que de certa maneira olham para a própria categoria, e outras que deslocam esse olhar para fora da categoria. Muitas discussões, por exemplo, em torno das políticas públicas, voltadas para o emprego, para inclusão social, para qualificação profissional, já são um sinal um pouco diferente dessa agenda do movimento sindical. Sinalizam um pouco os trabalhos futuros do DIEESE. Questões que também dialogam com o histórico de negociações do movimento sindical, que são as questões relacionadas à remuneração. Só que com um foco diferenciado. Hoje, as discussões em torno dos problemas de participação nos lucros e resultados, a produtividade, são outras formas de abordar a questão da remuneração, que devem estar mais presentes na agenda sindical.

 

 

Fatos Marcantes

 

 

Permanecer numa instituição por 20 anos te proporciona vivenciar muita coisa. São vários episódios. Um fato mais marcante, que expressa esse envolvimento, essa capacidade de entrega que temos, às vezes sem limites, ao trabalho que você faz, foi a negociação em torno da pesquisa de emprego e desemprego, no Paraná. O DIEESE realiza essa pesquisa em várias capitais. Há alguns anos atrás fazíamos esta pesquisa em Curitiba. Por conjunções políticas daquele momento, o Governo do Estado ameaçou romper o convênio com o DIEESE em torno da realização daquela pesquisa. Naquele momento, este fato exigiu muito empenho pessoal, muito processo de diálogo com Governo, com a sociedade, e marcou muito a realização do meu trabalho no DIEESE. Por conta desse processo, vivemos situações das mais inusitadas possíveis. Nós fomos, uma vez, numa reunião do Conselho Estadual de Emprego, onde havia, por parte de algumas lideranças sindicais a vontade de “seqüestrar” membros do conselho, acorrentando as pessoas numa sala para terem uma definição sobre a continuidade ou não da pesquisa. Vivemos esse momento de tensão muito presente. Como desdobramento disso, houve várias reuniões, vários embates técnicos com a Secretaria de Planejamento do Estado, onde explicitamos o ponto de vista do DIEESE na pesquisa, um debate público na impressa. Enfim, foi um momento de muita efervescência em torno da discussão do mercado de trabalho. Talvez o episódio mais inusitado tenha sido uma tentativa de negociação que empreendemos com o líder do governo na Assembléia Legislativa, que era um deputado do Paraná e que controlava politicamente a Assembléia. Tinha uma boa interferência no Executivo e também no Judiciário, o que lhe rendeu o apelido de “Buda” . Fisicamente, parecia muito com um Buda. Tivemos que fazer uma negociação com o “Buda” para ver se conseguíamos manter a pesquisa. E esse parlamentar já tinha a prática de receber em casa essas demandas. . Marcamos às sete horas da manhã um café na casa desse parlamentar, junto com a Direção Regional do Dieese no Paraná.. Ele era de origem árabe, como eu. Chegamos lá pensando que era a única reunião de trabalho que teria. Que nada! Já tinha uma romaria de parlamentares, de prefeitos, porque o grau de influência dele era grande. Nós sentamos numa mesa, uma mesa de café enorme, e ele, pé descalço no chão, só olhando a televisão. E a gente falando, falando, e ele não dava a menor atenção. Até que em algum momento, nós colocamos alguma situação, que ele identificou que seria uma oportunidade também política importante para ele. Ele balbuciou algumas duas palavras lá. (risos) Nós ficamos conversando com ele uma meia hora e ele falou: “Hã, hã, está bom.” Encerramos o assunto e fomos embora. Este episódio meio trágico, meio cômico, mostra um pouco essa capacidade que o DIEESE tem de estar buscando a interlocução onde ela é possível. Acho que esse é o grande aprendizado, o grande significado que fica para mim dessa situação e de outras semelhantes que eu vivi no DIEESE. Essa capacidade de dialogar, de tentar fazer essas costuras sem perder os valores, os princípios que orientam nossa atividade profissional. Quer dizer, nós não fomos lá nos vender, não fomos lá barganhar, negociar a pesquisa. Ao contrário, mostrar que ela era importante para referenciar as políticas públicas do Estado. Tivemos que passar por toda essa romaria com este “Buda” e com tantos outros que aparecem pelo caminho.

 

Avaliação/Dieese
 

A capacidade de trabalharmos coletivamente é minha principal avaliação. Isso é uma marca importante na trajetória pessoal e profissional. Nós ainda temos muito a crescer, muito a aprimorar. Mas o fato de trocarmos experiências, conhecimentos, o fato de você contribuir no texto de um colega e ele seu,, são poucas as organizações que abrem essa oportunidade de dialogar coletivamente. De outro lado a questão da identidade. Boa parte dos técnicos, dos funcionários que estão no DIEESE, estão hoje por um compromisso, por uma opção de trabalho, de vida. Acho que isso é difícil de você reconhecer em outros espaços de trabalho. Acho que isso que dá unidade, dá tesão pelo trabalho, te mobiliza para enfrentar os desafios, as intempéries.. A hora em que eu não acreditar que o meu trabalho está sendo útil, está a serviço da classe trabalhadora, eu vou buscar outra coisa para fazer na minha vida. Mas esse compromisso eu tenho muito presente comigo.

Eu me sinto hoje com a mesma perspectiva de 21 anos atrás. Ou seja, não escolhi um emprego, escolhi um trabalho. E um trabalho voltado para um determinado lado da sociedade, no caso a classe trabalhadora. Meu envolvimento como DIEESE é diário, cotidiano. Essa minha situação pessoal de estar administrando a família numa cidade e o trabalho nutra, é um pouco o retrato desse meu envolvimento. Quer dizer, é um trabalho muito prazeroso, dignificante para mim, cheio de muito sacrifico pessoal. E eu só tenho disposição para estar me distanciando em alguns momentos da família, deixando de ver alguns pedaços importantes do crescimento das minhas filhas, da relação com a minha mulher, porque eu tenho esse trabalho do DIEESE como algo muito forte, muito importante para o significado da minha vida. Eu me sinto hoje, podendo realizar esse trabalho, com a mesma vontade os mesmos princípios que eu tinha há 20 anos atrás. O DIEESE tem uma contribuição muito importante para o movimento sindical e para a sociedade. Uma coisa que me marcou muito na minha história no DIEESE foi um depoimento que o ex-diretor técnico do DIEESE, Walter Barelli, deu há uns anos atrás. Ele já não pertencia mais aos quadros do DIEESE, e historiava toda produção do DIEESE sobre o custo de vida e num determinado momento falou: “esse trabalho do DIEESE teve uma repercussão extremamente positiva e presente na distribuição da renda do país, através de vários indicadores...”. Eu acho que a constatação disso, que o DIEESE em certa medida, ao denunciar nos anos anteriores o sumiço da inflação, a maquiagem dos índices inflacionários e contribuir com esses trabalhos para que a renda do trabalhador, do assalariado não tivesse sido mais reduzida ainda, é o espelho, o retrato da importância do DIEESE. Não só para aquela categoria ou para aquela entidade sindical, mas para o conjunto da sociedade. No que se refere a esse ponto da questão nacional, que é uma melhoria da distribuição de renda, uma bandeira do movimento sindical, acho que o DIEESE teve uma atuação extremamente importante, decisiva nesse debate.

Estar promovendo o diálogo intersindical talvez seja o maior produto desta entidade. Isso não sou eu que estou falando, as próprias centrais sindicais, o próprio movimento sindical reconhece que esse é um dos grandes méritos da existência do DIEESE. Tanto é que, esta instituição é uma experiência ímpar no mundo. Essa possibilidade que o DIEESE abre de estar promovendo o diálogo intersindical, é o grande feito, a grande cara da instituição. E lógico que não faz isso sem ter todo um aparato técnico, de produção, de subsídio e apoio à ação sindical. Mas o fato de ele ter e preservar esse caráter intersindical, de estar podendo fazer com que o movimento sindical, através do DIEESE possa dialogar e convergir naquilo que é possível, creio que é a grande contribuição que o DIEESE dá ao movimento sindical e a própria sociedade. Mostrar que apesar de terem algumas diferenças, você pode dialogar e trabalhar nos pontos de convergência.

 

Família
 

A minha esposa é antropóloga. Eu gostaria que os economistas e o próprio DIEESE pudessem estar tendo um diálogo interdisciplinar maior, a ponto de trazer uma compreensão maior da realidade, através desse diálogo com diferentes disciplinas e ciências. Mas, ela trabalha com antropologia, com questões ligadas ao meio ambiente. A minha filha mais velha está na metade do curso de enfermagem. Acho que não vai ter nenhum assessor sindical em casa. A minha filha mais nova está iniciando o segundo grau. O que tenciona um pouco as relações em casa são as viagens. Mas mesmo quando estava realizando um trabalho na mesma cidade onde morava, a dedicação, enfim, os trabalhos além da jornada normal, traziam certa indisposição familiar. Agora, de outro lado eu tenho a compreensão delas. No sentido que reconhecem a importância desse trabalho para minha vida, do significado social desse trabalho, e isso acaba superando, em parte, essas dificuldades.

 

 

Avaliação/Projeto Memória

 

 

Era uma lacuna institucional muito grande, uma instituição como o DIEESE, com a história que tem e não ter tido oportunidade de fazer esse investimento na memória. A memória é fundamental não só para estar registrando nesse momento o que foi o trabalho do DIEESE, mas estar contribuindo para outras organizações, outras instituições, contando um pouco dessa história. Eu por muitos anos, trabalhei em escritório regional, acho que a capacidade de registro e resgate de memória fora de São Paulo é mais complicada ainda, portanto, esse registro é extremamente importante do ponto de vista institucional.

E eu me sinto muito, muito honrado em poder dar este testemunho, de parar um momento e falar: “vamos olhar para nossa história, vamos ver quão bonita ela é”. Acho que isso, para os colegas que estão chegando e de nós que já estamos a bom tempo, só vem recarregar nossa bateria. Parar e falar assim: “puxa, nós já fizemos tanta coisa. Tanta coisa linda, tanta coisa que deu errado”. (risos) Mas o saldo esta aí bem positivo. Isso renova para nós, que há muitos anos trabalhamos no DIEESE, a capacidade de nos doar,e, nos entregarmos a esse projeto.

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