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Ofélia Aparecida Gomes de Carvalho

ofelia_aparecida_gomes_de_carvalhoHistória de Vida

Identificação

Meu nome é Ofélia Aparecida Gomes de Carvalho, eu nasci em Guarasia, Minas Gerais. Meus pais são José Gomes Neto e Isméria Cândida de Oliveira.

 

 

Infância

 

 

Guarasia era uma cidade pequena. Eu e minhas irmãs morávamos com meus tios, porque minha mãe tinha um problema de saúde. Fui criada com os meus tios e minha avó paterna. Em 1960, minha irmã mais velha se casou e mudou para São Paulo. Eu vim morar com ela no ano seguinte e fiquei até me casar. Saí com 24 anos. Ela e meu cunhado que acabaram de me conduzir. Esses meus tios tiveram quatro filhos. Era uma casa muito grande, com muita gente. Meu tio tinha a única padaria da cidade. Convivi com esses meus primos, que são praticamente irmãos, até nove para dez anos. A casa tinha um quintal enorme. Foi uma infância muito boa porque tinha muita fruta no quintal. Brincávamos de casinha, fazíamos batizado de bonecas com comes e bebes, roupa para boneca... Todo evento (risos) era feito por nós, crianças. Apesar de não estar com a minha mãe, tive uma infância boa... Cidadezinha muito pequena, a igreja, o coreto.

 

 

Estudos

 

 

Eu fiz o primário num grupo escolar da cidade. Tínhamos até aula de música. Quando vim para São Paulo, fui estudar numa escola na Via Anchieta, porque minha irmã morava no Ipiranga [bairro de São Paulo]. Era uma escola municipal, de madeira, inclusive. Estudei também naquela escola, a Caetano de Campos, que era só para mulheres. Fiz lá o ginásio, depois de passar na Admissão, e o colegial. Aprendi muito lá. Havia aula de trabalhos manuais, pintura, bordado, trabalho em argila de barro e trabalhos em couro. Tínhamos que aprender os primeiros cuidados com um bebê, postura, boas maneiras. Eu lembro da professora Íris que nos obrigava a andar com livro na cabeça, essa coisa toda que usava antigamente. Foi uma escola muito legal, boa, tenho boas recordações de lá.

 

 

Juventude

 

 

Saíamos muito entre as primas, que eram várias. Eu tinha muitas amigas na escola, mas para sair, era entre a gente, irmãs e primos.Eu namorei escondido, porque minha irmã era muito preocupada. Com 15 anos, eu e minha prima, saíamos e namorávamos escondido. O pai dela era muito rigoroso. Íamos muito aos bailes. Cada semana o baile era na casa de um. Não faltávamos uma semana! Aproveitei bastante.

 

Trajetória Profissional

Com dezoito anos eu fui trabalhar numa loja, como balconista. Foi lá que conheci meu marido. Eram quatro portas e numa delas, na menor, havia a charutaria. Era uma espécie de bazar. Tinha de tudo: ferragens, louça, alumínio, malas de viagem, roupa feminina, masculina, em cada porta tinha uma seção. Ficava no Largo da Concórdia e trabalhei lá por um ano. Depois fui para uma loja de artigos de cama, mesa e banho no Bom Retiro. Fiquei três meses nessa loja, porque minha irmã começou a trabalhar e eu fiquei em casa com os meus sobrinhos, que eram pequenos.

Passou um tempo e veio um primo procurar trabalho em São Paulo. Fui com ele na agência de empregos e a atendente perguntou se eu não queria trabalhar. Deu-me a indicação de um advogado que precisava de uma recepcionista. O escritório dele era no mesmo prédio da agência, no décimo andar, ali na Bráulio Gomes. Mesmo sem avisar a minha irmã, subi e encontrei com o Almir Pazzianoto. Acabei trabalhando com ele por um ano.

 

 

Trajetória no Dieese

 

 

Depois desse um ano, ele me indicou para o DIEESE, porque como advogado dos sindicatos, ele tinha muito contato; qualquer orientação eles iam lá falar com ele. O Walter Barelli sempre ia lá. O Lula [Luis Inácio Lula da Silva], que era de São Bernardo, também ia. Ele me apresentou para o Walter Barelli e falou: “Eles estão precisando de uma datilógrafa. Você topa?” “Ah! Eu topo.” Saí de lá numa sexta-feira e comecei na segunda, no dia 3 de fevereiro de 75.

Quando casei, eu estava no DIEESE. Meu filho nasceu e eu saí. Fiquei oito anos em casa. Vendia roupa, algumas coisas extras. Quando meu filho fez oito anos, eu já tinha a minha filha do meio, com cinco anos. O Walter Barelli ligou lá em casa perguntou se eu não queria voltar para o DIEESE como telefonista. Era para trabalhar no período de seis horas. Fiquei 15 dias pensando se eu voltava. Decidi que sim e foi a melhor coisa que eu fiz na vida. Voltei no dia do aniversário do meu filho, 14 de outubro de 85, e estou até hoje.

 

 

Cotidiano no Dieese

 

 

Trabalhávamos muito. Aliás, eu sempre gostei do trabalho do DIEESE porque sempre foi voltado para o trabalhador. As pessoas que trabalham no DIEESE não estão só pensando no dinheiro. Vale o ideal, sempre lutando pelo trabalhador e eu me identifiquei com isso. Pessoal muito desprendido, trabalhavam com amor, era uma família na verdade, 15 pessoas, naquela época. Eu me lembro da época em que fazíamos o boletim do índice do custo de vida. Era uma correria grande porque ele não era impresso em gráfica. Nós que montávamos. Tinha prazo para divulgar e o que fazíamos? Datilografávamos e montávamos o boletim de maneira artesanal. Essa divulgação ajudava os trabalhadores, que era o objeto de atuação do DIEESE. Sempre houve muita preocupação em se atender bem às demandas dos sindicatos. Uma outra preocupação sempre foi com a questão dos relacionamentos. O DIEESE é uma entidade neutra e abriga as mais diferentes correntes políticas. Para nós, não há distinção.

 

Trajetória no Dieese

Eu passei por umas três, quatro fases de demissão voluntária, atrasos de salários, mas, por incrível que pareça, a maioria das pessoas trabalhava com muito afinco, mesmo nestes momentos difíceis. Os que chegaram depois tinham mais dificuldade de aceitar essa situação do DIEESE. É que a gente que trabalha no DIEESE tem que ter muito amor. Se você for por esse lado, de situação financeira, de progredir profissionalmente, é meio difícil, é mais trabalho mesmo, muito trabalho.

O DIEESE mudou bastante, cresceu, teve uma época em que ele cresceu muito, mas foi quando surgiram os maiores problemas financeiros. É um órgão que o pessoal precisa e usa, mas, infelizmente, não temos o retorno financeiro necessário. É o único órgão no mundo que oferece tudo para o trabalhador, prepara o sindicalista, dá todas as coordenadas que ele precisa. Em todos os sentidos, ele tinha que ser mais reconhecido.

De uns anos para cá, as coisas começaram a mudar. Acho que o movimento sindical começou a pensar nessa política de construção e manutenção do DIEESE. Foi quando começou a melhorar. Nunca tivemos uma época, assim, de tranqüilidade. Você vê os técnicos. Nossa! Uma loucura! Eles ficavam até de madrugada trabalhando naqueles planos econômicos. Eles amanheciam trabalhando e o salário, que era pouco, às vezes, nem saía. Trabalhavam muito, muita gente amanhecia aqui, principalmente nessas mudanças de política salarial e planos econômicos. Os técnicos são muito honestos, assim como o DIEESE que tem uma credibilidade enorme. O DIEESE é uma família, sempre foi. Atualmente, um pouco menos porque tem muito mais gente. Antigamente, final de ano, fazíamos almoço, reuníamos... Se alguém tivesse um problema, o outro ia ajudar. Uma família mesmo! Entre os trabalhos mais importantes, acho que é o levantamento do índice de custo de vida. Também os cursos feitos para os sindicalistas, de preparação, são importantes.

 

 

Escritórios Regionais e Subseções

 

 

O DIEESE tem um coordenador responsável pelos escritórios e pelas subseções. Antigamente, eram mais de 60 subseções. Houve uma queda, num período, e agora está aumentando. Duas vezes por ano, todos os supervisores se reúnem para tratar do planejamento do trabalho no DIEESE. Há também reuniões para treinamento dos técnicos novos onde eles são preparados, orientados, mas a maioria é muito antigo de DIEESE, muito antigo.

 

 

Direção Política

 

 

A direção sindical tem um mandato de três anos. Tem havido uma grande renovação dos dirigentes, muitos novos. Não é só novo na direção é também no movimento sindical. Demora um pouco para eles entenderem o que é o DIEESE.

 

Futuro do Dieese

Tenho muita esperança de que vai melhorar. Já esteve pior. Agora está normalizando. Tenho a impressão de que a direção está se preocupando um pouco mais. Agora tem as centrais sindicais que estão dentro do DIEESE; tem muitos projetos entrando e isso ajuda bastante para seguir. Apesar de ter diminuído bastante o número de sindicatos sócios, sinto que eles estão se preocupando um pouco mais. Antigamente, se os sindicatos tinham problemas financeiros, a primeira coisa que cortavam era o DIEESE. Hoje, parece que eles se preocupam mais.

 

 

Projetos

 

 

Os projetos são muito importantes. Geralmente, temos projetos com o governo, parcerias, tem as PEDs [Pesquisa de Emprego e Desemprego]. Outros convênios são na área de educação. Em 94, começou o PCDA [Programa de Capacitação de Dirigentes e Assessores Sindicais], que é um curso voltado para os trabalhadores. Este curso qualificou milhares de sindicalistas. Eram 45 dias de formação, divididos em módulos de 15 dias. Muitos que foram do PCDA são hoje da Direção do DIEESE. Isso ajudou, pois eles passam a conhecer melhor o DIEESE.

 

 

Família

 

 

Meu filho está no comércio. Trabalha com um grupo de representantes há dez anos. Cuida da parte financeira, faz cobrança, vende também um pouco. Ele gosta do comércio. A minha filha do meio é casada. Trabalhou na Anteag [Associação Nacional dos Trabalhadores em Empresas de Autogestão e Participação Acionária], na Secretaria do Trabalho, com o Márcio Pochmann, com a Rosana [de Freitas], lá em Osasco, e no Consórcio da Juventude. Ela agora está numa ONG, o Instituto Via Pública, que é do Pedro Paulo, que era diretor da Fundação SEADE. Minha filha mais nova está no Consórcio da Juventude. Eles gostam muito do DIEESE. A minha filha mais nova, quando tinha os cursos do PCDA lá no Hotel Atibainha, ia comigo. A diretoria a conhece desde pequena e ela adora o DIEESE. Até hoje quando ela vem aqui, todos gostam muito dela.

 

 

Avaliação/Trajetória no Dieese

 

 

Aprendi tanto! Aprendi a ter jogo de cintura, muita tranqüilidade, equilíbrio. Tive que aprender, principalmente para lidar com o pessoal externo. Nas fases difíceis, aprendi, porque eu trabalhei muito com o Sergio Mendonça, que é muito tranqüilo, muito humano. Aprendi muito com ele. Muita gente, às vezes, desabafava, reclamava, falava. Eu era meio colete de aço, porque vinha de tudo ali (risos): vinha bomba, vinha tudo; nas fases ruins, eu sempre ali no meio de campo, então eu aprendi muito mesmo.

Eu trabalho a maior parte do tempo com a direção técnica. A direção sindical nacional tem 45 dirigentes, a maioria de outros Estados. Eles vêm duas vezes no ano para reuniões com a direção técnica. Sou eu quem organiza estas reuniões, desde a passagem, hospedagem, material... Você acaba conhecendo cada um, como agir com cada um. Tenho que ligar [telefonar] para cada um várias vezes, ter jogo de cintura, porque não é fácil. Tem que tratar com jeito, cada um de uma Central. E nesses cursos do PCDA, onde as centrais que indicavam os participantes, eu tinha que estar muito atenta, Não podia colocar no mesmo quarto, pessoas de centrais diferentes porque dava choque. Depois com a convivência muitos se tornaram amigos, eles foram se unindo, e as coisas ficaram mais tranqüilas. Uma vez, num seminário que teve na Unicamp [Universidade de Campinas], eu era leiga nesse assunto e tinha CGT [Confederação Geral dos Trabalhadores], SDS [Social Democracia Sindical], CUT [Central Única dos Trabalhadores] etc. Eu não sabia muito bem distinguir. Chamei uma menina, acho que ela era diretora e falei: “Você é da "Central tal"?” E ela respondeu: “Pelo amor de Deus, você está me xingando?” Eu falei: “Ai, desculpe, desculpe”. Daí para frente, eu fiquei atenta a isso, a essas correntes. Agora não! Eles já estão se unindo mais, através do DIEESE. Não tem mais aquela coisa de que um não pode olhar para o outro. Melhorou muito! E graças ao DIEESE. Hoje eles ficam até no mesmo quarto, não tem problema algum.

 

Desafios

Depois que a última Direção Técnica saiu, em 2003, eu fiquei meio desmotivada, porque foi muita mudança. Eu fiquei com o [Walter] Barelli muito tempo. Não trabalhando diretamente, mas tinha muito contato. Depois, fui trabalhar com o Sergio Mendonça diretamente, durante uns dez anos. Com o Clemente [Ganz Lúcio], eu também já havia trabalhado, mas não diretamente. Na verdade, foi o Clemente que me tirou da função de telefonista do DIEESE, quando ele veio do Paraná. Ele era coordenador das subseções e escritórios regionais e eu era telefonista. Ele começou a me pedir para agendar reuniões e fazer outras coisas. Um dia ele falou: “Acho que você deve trabalhar na secretaria, ia ajudar bastante.” Então, fui para a secretaria. Quando o Sergio Mendonça se tornou diretor técnico, fui convidada para trabalhar como secretária dele. Eu estava acostumada com o Sergio, que é um perfil muito diferente do Clemente, os dois são totalmente diferentes. O Clemente é mais exigente, fiquei preocupada em dar conta, afinal, eu, com essa idade, tanto tempo de DIEESE... E ele queria uma mudança brusca na forma de trabalho. Eu pensei até em sair. Eu tinha muita afinidade com o Sergio, com o Wilson, com a Dedé, Solange, Prado... Nossa, foi realmente muito difícil! Mas, eu falei: “É um desafio, vamos lá.” Enfrentei. No início, foi meio estranho, mas agora estou mais tranqüila. Eu faço o que posso.

 

 

Avaliação/Projeto Memória

 

 

É muito bom, podermos falar, porque eu trabalhei praticamente toda a minha vida aqui. Eu acho que é gratificante. Eu gosto do DIEESE, trabalho porque gosto. Em 2003, fiquei sem receber três meses, eu e meu marido, que é pesquisador do DIEESE. Foi uma barra! Minha filha casou nesse período e não foi fácil a gente sobreviver. Mas, eu não desanimei. Passamos numa boa, por amor mesmo, porque muita gente não agüentou, saiu, mas eu fiquei, eu apostei, porque eu gosto muito, gosto mesmo, trabalho aqui por amor.

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